“Marquinho” por Mihai Cauli.

In Memoriam – Marco Augusto Sales Telles (Marquinho)

Abrimos um baú de fotos antigas à procura de fotos do Marquinho, imagens que recordassem nossa trajetória conjunta de algumas décadas, mas não encontramos. A lembrança dele ficou em nossa memória. E por que esta ausência de fotos? A pergunta nos levou a esta breve reflexão sobre aqueles tempos passados.

O Ato Institucional nº 5, promulgado em 13 de dezembro de 1968, ficou conhecido como o golpe dentro do golpe. A partir daí, os direitos e garantias individuais estavam suspensos e teve início um período medonho de caças às bruxas em todos os espaços da sociedade brasileira, onde a prática da tortura e o desaparecimento de pessoas passaram a fazer parte do cotidiano.

Uma parcela significativa do que tínhamos de melhor na sociedade brasileira foi exilada: artistas, cientistas, professores, ativistas políticos e suspeitos em geral, comprometidos com o campo democrático.

Paralelamente a isso, as formas de resistência organizadas e desorganizadas, algumas espontâneas, foram ganhando forma. Em que pese o jogo duro e a prática da censura, por mais paradoxal que possa parecer, em pleno Brasil do AI-5, havíamos ingressado talvez no período mais fértil e criativo de nossa música popular, com a emergência simultânea de grupos regionais que digeriam nossas ricas tradições musicais e literárias, numa inserção profunda nos dilemas humanos e brasileiros.

No movimento social, devido ao cerceamento e às variadas formas repressivas, até 1977, foi o movimento estudantil que funcionou como válvula de escape das demandas sociais infladas, acumuladas por um modelo de crescimento acelerado, mas insustentável em suas bases pelo endividamento externo e desequilíbrios distributivos, macroeconômicos e regionais. Nesse período de fermentação, o movimento estudantil não teve o glamour ou as mesmas frases da década anterior. Vivendo as agruras de sermos suspeitos, as fotos de grupos eram poucas, raras. As “questões de segurança” estavam sempre presentes.

Foi nesse fermento dos anos 70 que recomeçou o cozimento do pão da democracia brasileira. Sem as suas derivações, não se entende a luta pelas liberdades democráticas, anistia e diretas já, que têm seu delta na Constituição cidadã de 1988 e seu papel na ampliação dos direitos sociais.

Marco Augusto viveu este tempo histórico brasileiro intensamente. A militância pela democracia esteve no centro de sua vida. Junto com toda uma geração dos “Sem Medo de Ser Feliz”, esteve nas lutas e manifestações, agitando bandeiras e cantando canções de paz e esperança.

O que está em questão no Brasil de hoje é a reafirmação desse percurso repleto de dificuldades, lutas, sonhos e de uma esperança louca. Por mais que as forças do retrocesso e o travo amargo da razão nos tirem o sono, afirmamos que queremos porque queremos um Brasil mais justo, inclusivo e democrático. O melhor está por vir!

Marco Augusto ingressou na Faculdade de Economia da UFF em 1972. Foi um militante ativo no movimento estudantil, um dos fundadores da Convergência Socialista e posteriormente do Partido dos Trabalhadores, onde ficou filiado até seu falecimento. Profissionalmente, foi economista do DIEESE, na Secretaria de Estado do Trabalho/RJ, na FINEP e na assessoria ao deputado Gilberto Palmares, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política.

Ilustração: Mihai Cauli  e  Revisão: Celia Bartone
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