O episódio que ficou famoso pela frase “cidadão não, engenheiro” dita por um cidadão contra outro, que atuava como servidor público no momento da ridícula situação, expôs a ideologia de distinção social presente na sociedade brasileira. A divisão de classes sociais no Brasil e no mundo se mostra diretamente pela renda e propriedade, mas também indiretamente pelas profissões, lugares frequentados, carros que andam, marca de roupas que usam, estilos musicais que ouvem, tipo de carne que comem, e inúmeros detalhes que servem de diferenciação social.

Esse tipo de distinção coloca o outro como inferior, como se cada pessoa nascesse com determinado caráter, habilidades e genes que o predestinassem a ocupar determinada posição na hierarquia social. Em defesa de um liberalismo sem direitos sociais e proteções do Estado, os libertários e liberais mais ideológicos defendem que a desigualdade social atual é natural, pois algumas pessoas são mais esforçadas ou capazes que outras. Esse tipo de pensamento que naturaliza a desigualdade brutal de hoje com um pensamento roubado e deturpado da biologia evolucionista tem como prima a teoria das elites do fascismo.

Enquanto a Sociologia já entende há décadas que a desigualdade que vemos hoje é fruto de posições nas hierarquias política, econômica ou militar (que se entrelaçam) e é imposta pela força, a ideologia liberal ainda defende a desigualdade que vemos hoje como fruto da natureza, revelando nas entrelinhas que crê em elites naturais que formam uma sociedade de classes, ou castas, que seria, portanto, uma forma eficiente e justa de organização da sociedade.

O pensamento de se diferenciar do outro se colocando em uma classe superior é antigo na humanidade e justificou o colonialismo, a escravidão e permanece até hoje dentro do racismo estrutural da sociedade brasileira. Racismo esse que aparece no mundo não só separando brancos de negros, mas ocidentais de orientais, e diferenciando povos através de nacionalidades. Impondo papéis sociais a pessoas com base em sua cor, nacionalidade ou classe social, nossa sociedade continua alimentando ideais que tornam o mundo mais injusto e violento do que poderia ser.