Há muito tempo, os pastores de algumas igrejas evangélicas vêm se especializando em arrancar tudo o que podem até de quem não tem nada. Os cultos se transformaram em verdadeiros aspiradores das economias dos fiéis. A Igreja Universal do Reino de Deus (Igreja Universal) é uma delas. Agora, o Ministério Público do Rio de Janeiro diz ter encontrado indícios de que a Igreja Universal foi usada para lavar dinheiro da corrupção na prefeitura do Rio, cujo titular é o bispo licenciado Marcelo Crivella. Segundo o Ministério Público, houve movimentações atípicas de nada menos que R$ 6 bilhões nas contas da Igreja Universal, no período de um ano – de 1º de maio de 2018 a 30 de abril de 2019.

Investigar a prática dessas igrejas já não era sem tempo. Em 1989, o pastor dissidente da Universal, Carlos Magno, divulgou um vídeo em que o bispo Edir Macedo ensinava os membros da cúpula da igreja a avançarem nos bolsos dos frequentadores dos templos. Gesticulando muito e, em tom de deboche, Macedo dizia: “Você tem que chegar e se impor. Olha pessoal, você vai ajudar agora na obra de Deus. Se quiser ajudar, amém, se não quiser, Deus vai escolher outra pessoa para ajudar”. E prosseguia: “Entendeu como é que é? Se quiser, bem, se não quiser, que se dane. Ou dá ou desce. Porque aí o povo vê coragem em você. Se for aquela coisa chocha, não vão confiar em você. Você tem que ser o super-herói do povo.”

Carlos Magno divulgou também as imagens de uma reunião realizada num hotel 5 estrelas de Angra dos Reis-RJ e acrescentou que, na época áurea da Igreja, havia respeito com o dinheiro doado, que era sagrado para Deus. As reuniões eram na própria sede da Igreja. Depois, segundo Magno, Edir Macedo “mudou a visão e as reuniões passaram a ser feitas em hotéis cinco estrelas, com grupo de mais de cem pessoas, gastos com lanchas, iates, convidados ilustres, como são os casos de deputados”. E essa mordomia toda é bancada, desde então, com o dinheirinho suado dos fiéis, por mais humildes que sejam.

Aí parece estar o início dessa voracidade arrecadadora, que foi adotada também pelos dirigentes de outras denominações religiosas. É o caso de Marco Feliciano, pastor-presidente da Igreja Assembleia de Deus – Catedral do Avivamento. Diz ele, dirigindo-se aos fiéis, que “a benção da prosperidade NÃO vem lá de cima. Vem de onde? Se for homem, coloque a mão no bolso; se for mulher, coloque na bolsa. Vem daí. A prosperidade está no seu bolso.” Com isso, ele quer dizer que só será ajudado por Deus quem doar para a Igreja. E ainda sugere ser magnânimo ao dizer: “Esta noite, eu vou lhe dar uma chance de ser abençoado”.

Marco Feliciano usa vários argumentos para extrair dos fiéis as doações, que são chamadas espertamente de “sementes”. Inclusive, apelando para a competição com outras igrejas. “Queria que não perdêssemos para outros segmentos do cristianismo. Nós não podemos perder para eles nesta noite.” Em seguida, passa a recolher dinheiro, cheques pré-datados e até cartões de crédito. “(Fulano) doou o cartão, mas não doou a senha. Aí não vale. Depois vai pedir um milagre pra Deus e Deus não vai dar e vai falar que Deus é ruim.” Mas o pastor não se contenta com esse crime. Ele vai em frente, encontrando uma maneira de arrancar dinheiro até de quem não tem um centavo no bolso. “Os que estão sentados é porque não têm nada, com certeza. Então, os que estão de pé devem olhar quem está sentado ao seu lado e emprestar um dinheiro a eles, só para eles não ficarem sentados”.

O mais chocante é quando um deficiente físico chamado Juscelino Luiz, falando com certa dificuldade, aproxima-se em sua cadeira de rodas e diz que vai doar R$ 1.000,00. Diz ele: “Dias atrás eu vim aqui e disse assim: ah, Gedeão está virado no negócio de ganhar dinheiro. Ali, eu imagino que Satanás tava cegando a minha mente. E hoje, eu quero ver a minha vitória aqui, pela fé: R$ 1.000,00”. Feliciano, ainda visivelmente impactado, diz que Juscelino vai voltar para casa como o homem mais abençoado da festa. Passando a mão na cabeça do doador, o pastor já vislumbra ali uma oportunidade de explorar a sua deficiência: “Ainda vou pregar com você por aí, viu garoto?”

Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, é outro pastor visto como um espertalhão. Em entrevista a um programa de TV, disse que tinha ouvido o seguinte comentário do apresentador Ratinho: “Cara, sabe o que eu acho interessante em você? É que você diz assim: não adianta tirar dinheiro do pão dos teus filhos nem das tuas contas pra mandar pra mim. Não, porque você vai estar ferrado, Deus não vai quebrar o teu galho, não. Então, cumpra a sua obrigação de cidadão.”

O único problema destas belas palavras é que estão muito distantes da realidade. E a mentira é de quem, Malafaia ou Ratinho? Porque, na verdade, o pastor diz aos fiéis que, se não tiverem dinheiro nem talões de cheques, não tem problema. Como todas as coisas desse mundo, o cartão de crédito foi criado por Deus. E se Ele criou é para ser usado. Ele não iria criar o cartão pra ficar na gaveta, não teria sentido. Criativo, Malafaia ensina como contribuir: “Por exemplo, eu pago R$ 500,00 de aluguel. Eu vou oferecer uma semente (doação) de um aluguel para que o Senhor possa abrir a porta pra eu ter a minha casa própria.”

Mostrando-se extremamente generoso, ele informa que o valor de um aluguel pode ser doado à vista ou então ser dividido entre os meses de abril e dezembro. E da maneira que o doador quiser – em um mês doa R$ 30,00, no outro R$ 50,00, desde que complete o valor de um aluguel até o final do ano. Se não fosse uma fraude, o esquema de realizar o sonho da casa própria por apenas R$ 500,00, é realmente irresistível. Ele tem uma receita também para quem está pagando a casa própria: “Você vai pegar o valor de uma mensalidade e pagar de uma vez ou então dividir, como quiser, entre os meses de abril a dezembro. Isto é para que Deus te dê os recursos até o final para quitar essa casa”.

Ao contrário do que disse Ratinho, Malafaia não perdoa nem quem está morando de favor: “Você vai pegar 30% do que ganha em um mês, e dividir entre os meses de abril a dezembro”. Mas, e se além de morar de favor, a pessoa está desempregada? Aí, é demais. Qualquer bandido comum teria desistido da empreitada, mas não o pastor Malafaia. Ele orienta o fiel a doar 30% do valor de um mês de ajuda. Com isso, Silas Malafaia, que já foi chamado de Silas Maracutaia, ao contrário do que teria dito o apresentador Ratinho, arranca dinheiro até de quem está zerado. O pastor criou uma espécie de “trízimo” para os fiéis.

Esse esquema criado por Edir Macedo está dando super certo. Mas apenas para quem recolhe as “sementes”, que germinam, isto sim, no quintal dos bispos e pastores. Hoje, vários líderes dessas igrejas estão milionários e até bilionários, dispõem de jatinhos e mansões cinematográficas. De acordo com a revista Forbes, Edir Macedo é o mais rico, com um patrimônio de nada menos que R$ 4,7 bilhões. Ele mora numa mansão de 4 mil metros quadrados de área construída. No espaço do seu imóvel, cabem nada menos que 100 apartamentos conjugados, de 40 metros quadrados cada um. Macedo controla ainda uma gravadora, a Folha Universal e a TV Record, a segunda colocada no ranking das TVs abertas.

O patrimônio de Waldemiro Santiago, um ex-Universal e fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus, é calculado em R$ 1,1 bilhão. O terceiro colocado, R.R. Soares, é detentor de uma fortuna calculada em R$ 625 milhões. Segundo a revista, “se acontecer de você ser um pregador evangélico brasileiro, as chances de ganhar na loteria celestial são realmente muito altas hoje em dia.”

Conhecendo a prática criminosa desses vendilhões do templo, que se apresentam como representantes divinos na Terra e prometem prosperidade em troca de doações, explorando até pessoas que passam por dificuldades extremas, é o caso de se perguntar: Como pode tanta gente acreditar que eles acreditam em Deus?