O mundo do trabalho encontra-se diante de notável inflexão motivada tanto pela pandemia de Covid-19 quanto pelo impacto das medidas governamentais adotadas desde o mês de março de 2020. A trajetória acumulada nos últimos cinco anos (2015-2019) aponta regressão significativa em termos quantitativo e qualitativo dos postos de trabalho, atuando no rebaixamento geral das condições de vida dos brasileiros.
Neste ano, o agravamento se apresenta negativamente de forma inédita em termos históricos. O comportamento mais recente da situação do trabalho no Brasil tem sido revelado pelo conjunto das informações divulgadas pelo IBGE através da tradicional Pnadc (amostra móvel trimestral) e da recente inovação experimental da Pnad Covid (amostra mensal).
Exemplo disso refere-se ao comportamento do mundo do trabalho nas grandes regiões do país. O contraste do conjunto dos dados disponibilizados pelo IBGE para o mês de maio de 2020, comparado com o primeiro trimestre do mesmo ano, evidencia a trajetória de redução profunda na ocupação, rendimentos e massa dos rendimentos dos ocupados.*
Para o Brasil como um todo, nota-se que a massa real de rendimentos dos ocupados foi 10,8% inferior no período em referência. Como a massa de rendimentos resulta da relação entre quantidade de ocupados e o rendimento médio auferido, percebe-se o quanto foi distinto o seu comportamento, com a redução no nível da ocupação em 8,5% e a de 3,2% no rendimento médio.
Em relação às cinco grandes regiões geográficas do país, observa-se ainda maior diferenciação. A começar pela massa real de rendimento, que sofreu a maior queda no Sudeste (-12,8%), seguida das regiões Norte (-10,2%), Nordeste (9%), Centro-Oeste (-8,6%) e Sul (-7,5%).
No que diz respeito, ao nível de ocupação nas grandes regiões brasileiras, a diferenciação também se pronunciou fortemente. O Norte registrou a maior diminuição no total de ocupados, com redução de 13,8%, e o Sul a menor (-5,1%), com quedas maiores no Centro Oeste (-6,9%), Sudeste (-8,4%) e Nordeste (-9,8%),
Por fim, o comportamento do rendimento real médio no conjunto dos ocupados bem dessemelhante entre as regiões do país. Somente o Norte apresentou crescimento no rendimento real médio (0,7%), ao passo que as demais regiões apontaram queda, sendo a maior no Sudeste (-5,1%), acompanhada do Sul (-2,8%), Centro-Oeste (-2,1%) e Nordeste (-0,3%).
No balanço geral, compreendem-se como a pandemia de Covid-19, bem como as medidas governamentais adotadas afetaram muito diferenciadamente as grandes regiões brasileiras. Se o critério de análise fosse os estados ou até mesmo os municípios do país, o grau de desigualdade no comportamento do trabalho poderia ser ainda mais expressivo.
Nesse sentido, um país de dimensão continental, que traz consigo a herança das desigualdades regionais, parece sinalizar atualmente o aprofundamento de suas diferenças no território. Pelo menos é o que se pode perceber na abordagem do tema do trabalho durante a pandemia de Covid-19.
Ao se projetar o que já se constata no curso do comportamento do trabalho nas grandes regiões brasileiras para o período pós-pandemia, pode-se antecipar o reforço da desigualdade numa nação já muito desigual. Isso é claro, se não houver ações governamentais diferenciadas, capazes de responder ao quadro atualmente revelado pela análise do conjunto das informações disponíveis sobre o mundo do trabalho.
* Diante de questionários, pesos e períodos diferentes, o contraste entre a Pnadc e a Pnad Covid19 permite apontar algumas tendências no comportamento do mundo do trabalho. Ver mais detalhes no sitio do IBGE.