A indústria do petróleo mundial está vivendo um período de grande incerteza e volatilidade. É possível apontar três drivers para o atual momento: a Covid-19 e as medidas de lockdown social adotadas para conter o avanço do vírus; as tensões geopolíticas entre os integrantes da OPEP acerca de acordos para a redução da produção de petróleo; a retração da economia mundial entre 6% a 7,6% em 2020. Diante destes fatores, a OPEP estima uma queda de até 30% na demanda mundial por combustíveis.
As incertezas e a volatilidade da indústria de petróleo mundial têm forte impacto na industrial nacional e, principalmente, na economia do estado do Rio de Janeiro. O setor de óleo e gás (O&G) fluminense representou 5% do valor adicionado da economia no ano de 2017 (último dado disponível nas contas regionais do IBGE). No ano de 2019, a produção fluminense de O&G em barris de óleo equivalentes (boe) representou 75,27% da produção nacional evidenciando a importância do setor tanto para a economia regional quanto nacional. Cabe destacar que o setor O&G do Rio de Janeiro tem importância substancial nos orçamentos do estado e municípios por meio das receitas de royalties e participações especiais (PE).
As incertezas em relação à economia mundial, a redução das demandas internacional e nacional por combustíveis atrelada ao baixo nível de preço da commodity no mercado internacional (redução de 65,86% comparando janeiro e abril de 2020), sem dúvidas, farão com que investimentos, até então viáveis, deixem de ter viabilidade econômica. Como consequência, as petroleiras irão rever suas posições de investimento para o ano de 2020.
No estado do Rio de Janeiro, a promulgação do decreto estadual que trata do distanciamento social levou aos governos estadual e municipais preverem uma redução média de 30% na arrecadação de impostos – ICMS, IPVA, ISS, ITBI e IPTU, durante o período de isolamento. Porém, as receitas oriundas dos royalties cresceram 21,88% nos primeiros cinco meses de 2020, em relação ao mesmo período de 2019. Apesar do excelente resultado acumulado, em maio estas transferências de royalties foram 30,31% menores do que no mesmo mês no ano anterior. As participações especiais referentes à produção realizada do primeiro trimestre de 2020, pagas em maio, tiveram queda de 17,54%, em relação ao mesmo período no ano anterior.
Como estas transferências no mês de maio apresentaram queda em relação ao mesmo período do ano passado e, aliado à redução da arrecadação própria, os secretários estão percebendo uma deterioração da situação fiscal. Sinalizam, inclusive, com a possibilidade de atrasos de salários para os próximos meses, caso esta realidade se mantenha. Ao contrário deste cenário catastrófico, aponto para uma luz no fim do poço, pelo menos, no que tange as receitas de royalties.
A produção de O&G no estado apresentou crescimento de 26,81% no primeiro quadrimestre do ano de 2020 em relação a 2019. Mesmo no mês de abril, auge da pandemia no Brasil e no exterior, a produção aumentou 25,59% em relação ao mesmo mês de 2019 e 4,79% em relação a março do corrente ano. O que explica este resultado é a alta produtividade dos campos do pré-sal e excelente característica do petróleo brasileiro – grau API médio de 27,9 e baixo teor de enxofre – que impulsionaram as exportações, principalmente, para China e Estados Unidos. O mês de abril bateu recorde de exportação alcançando um milhão de barris exportados por dia. O recorde anterior havia sido estabelecido em dezembro de 2019, quando foi atingida a marca de 771 mil barris por dia.
Conjecturando que a produção no estado continue crescendo na ordem de 20% em relação a 2019, o preço do barril permaneça próximo à marca dos $40 por barril e o real não se valorize frente ao dólar, as receitas dos royalties e PE apresentarão novamente crescimento no próximo mês, quando comparado a 2019. Esta afirmação fundamenta-se no fato de que o preço médio do barril apresentou um baque de 41% em maio deste ano em relação a 2019 e o real se desvalorizou 37,7% no mesmo período. Ou seja, estes dois fatores se anulam e o ajuste na arrecadação dos royalties e PE dar-se-á por meio da produção. Assim, a preocupação dos secretários pode recair sobre outras receitas.
Apesar deste alento para as contas públicas e, até mesmo para o déficit público, em alguns casos, cabe aqui uma crítica a ser realizada tanto no âmbito do executivo estadual quanto aos executivos municipais. Se as receitas de royalties e PE não tivessem sido utilizadas para despesas fixas – como contração de pessoal e, consequentemente, pagamento de pessoal -, mas, ao contrário, tivessem uma parte sido destinada à compensação financeira para as gerações futuras e uma parte direcionada para um fundo de reserva, antevendo à volatilidade inerente ao setor, esta preocupação em relação a este recurso com certeza seria menor ou, até mesmo, não existiria.
Apesar das previsões realizadas aqui para as receitas de royalties e PE se apresentarem otimistas para os próximos meses, a situação orçamentária para o ano de 2020 dos executivos do Rio de Janeiro é catastrófica. Caso o socorro aos estados e municípios não aconteça nos moldes aprovados pela câmara dos deputados – o Senado alterou a forma de divisão do montante de R$ 60,1 bilhões e não contemplou plenamente o estado fluminense-, o Rio de Janeiro, que já vinha atravessando uma grave crise econômica, fiscal, política e social desde 2014, vai passar por um problema orçamentário e fiscal sem precedentes com interrupção dos gastos públicos, possível atraso de salários, redução dos investimentos em saúde, segurança e educação entre outros.
Ademais, no Rio de Janeiro a máxima de que “não há nada que seja tão ruim que não possa piorar” parece válida: abertura do processo de impedimento do governador Wilson Witzel agravando ainda mais a instabilidade política, rompimento do executivo estadual com o governo federal, regime de recuperação fiscal atrelado à ação direta de inconstitucionalidade que versa sobre redistribuição das receitas de royalties entre os entes da federação pelo STF. Neste cenário, se o pacto federativo não for rediscutido com a urgência necessária, o Rio de Janeiro sairá da pandemia com graves mazelas socioeconômicas tanto no tecido social quanto no tecido produtivo, o que empurrará o estado fluminense para uma grave e longa recessão.