Na sequência dos desatinados acontecimentos do Oriente Médio, extensão do conflito entre palestinos e israelenses, no último final de semana o Irã deflagrou um ataque aéreo contra o território israelense, revidando o ataque israelense ao consulado iraniano na Síria, que matou alguns oficiais da Guarda Revolucionária iraniana presentes naquele local. O contra-ataque iraniano, apesar de representar tudo o que os analistas avaliam como o grande risco do conflito em Gaza – o envolvimento direto de mais e mais países – aparentemente, pelo menos a acreditar em alguns analistas que pareceram bem informados, foi um movimento negociado com vários outros atores maiores. Ele representaria um revide, mas impondo o menor número de baixas possível, no sentido de permitir que Israel não tivesse que adotar de imediato medidas de retaliação que poderiam fazer escalar o conflito.

Apesar de aparentemente concertado e da escalada ficar em suspenso até aqui, o movimento provocou uma outra escalada, esta já prevista. Os preços do petróleo deram uma subida de patamar, e durante o final de semana todos temeram por uma disparada nos mercados na segunda-feira, o que acabou não acontecendo. Os preços subiram, mas não seguiram subindo. As bolsas não despencaram, e neste aspecto tivemos variações de vários tipos. Mas evidentemente, face à instabilidade evidente, os maiores indicadores de fragilidade internacional se fortaleceram, o próprio dólar estadunidense e o ouro. Mais ainda com as sinalizações do banco central dos EUA, o Fed, de que não iria seguir imediatamente sua política de baixa da taxa de juros, o que fez o dólar dos EUA se fortalecer ainda mais.

A crise no Oriente Médio explicita o que muitos temem e seguem falando em tom baixo: o mundo segue com enormes potenciais de turbulência financeira. A crise de 2007/2008 não é um fantasma, segue viva, e os mercados financeiros ainda não operam em segurança e tranquilidade. Claro, sempre há os especuladores que são pescadores de águas turvas, e que ganham com essa situação, mas ela acaba impondo aos bancos centrais de todo mundo um comportamento mais e mais conservador, sinalizando para uma aversão geral ao risco. As guerras em curso (Ucrânia, Palestina) vão se arrastando e não permitindo uma mudança da situação.

Nesse quadro, se reúnem para as chamadas “reuniões de primavera” o FMI e o Banco Mundial (normalmente as instituições de Bretton Woods, FMI e Banco Mundial, com seus principais acionistas, os países membros, representados por seus ministros de Finanças/Fazenda e presidentes de bancos centrais, se reúnem duas vezes por ano, na primavera e no outono). No meio da turbulência, é hora de reforçar o discurso conservador, e falar de mais e mais necessidade de ajuste, voltando à nota só do conservadorismo financeiro internacional.

E o Brasil com isso? Bem, o Brasil acabou sendo um dos mais “sacudidos” pela turbulência. O dólar saiu bem rápido de R$ 5,00 a mais de R$ 5,25, com o real sendo uma das moedas mais afetadas pelos movimentos internacionais. Com isso, voltou por aqui um discurso que já vinha presente nas entrelinhas da última ata do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, que falava de uma revisão a respeito da política de redução da taxa básica de juros ao longo do ano. Os nossos “pescadores de águas turvas”, grandes e poderosos, ganharam provavelmente muito com os sobressaltos dos mercados.

A situação começou a se acalmar um pouco passados dois dias dos movimentos mais agudos, mas a sinalização da fragilidade ficou evidente. E os de sempre, os arautos dos interesses do mundo financeiro, reverberaram o discurso conservador de toda parte: aumento de juros, ajuste fiscal.

Evidentemente isso é tudo o que não se precisa para o país no momento em que o fundamental é retomar o desenvolvimento de forma vigorosa, ampliar a inclusão social, acelerar a transição energética rumo a uma economia de baixo carbono, ampliar o gasto social em saúde e educação, e avançar na construção de uma infraestrutura de transporte, habitação e saneamento, só para ficar em algumas coisas sobre as quais não se tem muita discussão. Tudo precisando de gastos públicos, investimentos públicos e investimentos outros que poderiam ser incentivados pela baixa do juros. Mas os que preferem o ganho fácil nos mercados de títulos públicos do que a construção de uma nova alternativa de desenvolvimento nacional vão colocando os habituais empecilhos.

Pena, porque face às turbulências internacionais era o momento de reforçar a busca de uma alternativa nacional, o máximo possível desvinculada dos turbulentos mercados internacionais de commodities e finanças. Nós tínhamos e temos potencialidades para isso, e há tanta coisa a ser construída e mudada. Mas, aparentemente, vamos ficando mais uma vez reféns dos velhos discursos hegemônicos.

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Ilustração: Mihai Cauli
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