A B3, a bolsa de valores brasileira, tem sofrido fortes turbulências ao longo dos últimos pregões, na semana passada e nesta. A situação já não era tranquila antes, mas houve por um tempo um movimento de subida no começo desse ano. Ou seja, apesar do avanço da pandemia, da economia real patinando, das estultices da figura presidencial, e de um quadro internacional com sinalizações em diversos sentidos, estranhamente o valor das ações avançava, voltando a se aproximar dos tais “120 mil pontos” que fazem os olhos dos aplicadores financeiros.
O que mudou no último período? É razoável apontar que a troca da presidência da Petrobras, ainda em fase de processamento, é o único ou principal motivo, ou ao menos um motivo para o que vem ocorrendo? Ou ainda, que com os acontecimentos da Petrobras tenha ficado evidente para o mercado que fatos estranhos determinam ganhadores de milhões na jogatina do mercado de ações, como apontou em seu blog e no jornal O Globo a jornalista Malu Gaspar.
De fato, para além das suspeitas movimentações em torno da saída do presidente da Petrobras, o mundo real não anda dando moleza. Os indicadores da economia mostram que estamos bem longe da tal “retomada em V”. Os números agora divulgados para o fechamento do ano de 2020 mostram que o PIB apresentou uma retração de 4,1%, e no último trimestre do ano um recuo de 1,1%, puxado setorialmente por indústria e agropecuária. Nada de recuperação substancial da atividade econômica, como alardeado pelo ministro da Economia. E isso em um quadro em que a piora do quadro nacional da Covid-19 é evidente nos primeiros meses desse ano, ao lado de um lentíssimo processo de vacinação (mas que felizmente avança, apesar de todos os percalços). A combinação é dramática, pois qualquer coisa parecida com uma normalização da atividade econômica pressupõe um recuo substancial do quadro da pandemia, o que parece ainda um objetivo distante, em um momento em que longe de arrefecer, a crise sanitária se agrava.
Os investidores internacionais parecem continuar com o pé atrás em relação ao Brasil. Depois de uma saída de dólares de quase US$ 45 bilhões em 2019, seguida de outra saída de cerca de US$ 28 bilhões em 2020, os movimentos no início de 2021 seguem sendo de saída de capitais. Somada a saída de capitais com a especulação com a moeda, o dólar estadunidense volta a se aproximar de R$ 6 por dólar, sinalizando nervosismo (muita gente do mercado financeiro insiste que os fundamentos deveriam garantir um dólar em torno de R$ 5,00, o que vai ficando cada vez mais distante). A variação cambial sinaliza descrédito e nervosismo, por um lado, mas em uma economia comercialmente aberta e com indexadores de preços parcialmente desmontados desde a segunda metade dos anos 1990, o dólar estadunidense acaba sendo um poderoso indexador, e a desvalorização do real frente ao dólar dos EUA (e outras divisas) seguramente terá um impacto de aumento de preços (como teve em momentos do ano passado), ajudando o estresse das expectativas sobre a economia brasileira.
O quadro externo também não é dos melhores, e vários analistas começam a reforçar as análises que dão conta de uma bolha especulativa em vários mercados internacionais, alimentada pelas políticas de expansão monetária adotada pelos bancos centrais a nível mundial. Em um quadro em que a pandemia persiste, e em que talvez, fora o caso da China, as retomadas das várias economias estão longe de serem animadoras, a entrada de bolhas especulativas dos radares devem operar no sentido de muito maior cautela dos aplicadores, capitais buscando “portos seguros” e menos recursos para países emergentes, em especial os que buscam por sua própria vontade a condição de “pária internacional”, como afirmou por aqui o nosso ministro de Relações Exteriores há pouco tempo atrás.
Ou seja, para além dos acontecimentos recentes de Brasília decorrentes de termos um presidente com o comportamento permanente de um “fio desencapado”, o fato é que o conjunto da obra, seja o desempenho da economia real, seja a conjuntura e as perspectivas para a economia internacional, ajuda, e muito, a explicar as turbulências econômico-financeiras mais recentes no mercado brasileiro. E possivelmente muito mais turbulência vem por aí
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