As pesquisas divulgadas na semana passada mostraram, no agregado, uma resistência do suporte ao governo federal. Os números do Instituto Datafolha, divulgados na Folha de S. Paulo de 29 de abril, ou seja, algum tempo depois da saída do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e imediatamente após a saída do ministro da Justiça, Sérgio Moro, mostra que apesar da popularidade dos ministros defenestrados, os efeitos agregados na popularidade do governo foram pequenos.

Os números desagregados entretanto, mostram mudanças que não devem ser desprezadas. Se entre os que ganham até três salários mínimos, os que avaliam o governo Bolsonaro como ótimo e bom subiu de 24% para 32% entre dezembro/2019 e abril/2020, no mesmo período os indicadores entre os que ganham mais de cinco salários mínimos passaram de 44% a 35%, enquanto nesta faixa de renda a avaliação do governo como ruim/péssimo subiu de 30% a 41%.

Quanto ao corte de escolaridade, os números seguem na mesma direção. Entre os que têm ensino fundamental, a avaliação do governo como ótimo e bom vai de 29% a 37%, enquanto a avaliação como ruim/péssimo cai de 39% a 35%. Na faixa de ensino superior, enquanto ótimo/bom cai de 35% a 31%, a avaliação como ruim e péssimo sobe de 36% a 47%, segundo a pesquisa Datafolha.

Uma leitura possível aqui é a de que os mais pobres (e com menor escolaridade) se sentem beneficiados pelo auxílio emergencial, que apesar de na sua forma final ter sido desenhado pelo Congresso, especialmente a Câmara de Deputados, o associam a uma “benesse” do governo federal, já que sua implementação se dá pelos instrumentos do poder executivo. De outro lado, a vacilação quanto ao enfrentamento da pandemia, muitas vezes confrontando o bom senso e o consenso internacional (como no tema do isolamento social), com a aposta em crendices e suposições contra a avaliação científica mais consolidada, faz com que o governo perca evidentemente suporte nas faixas de maior renda, e em especial nas faixas de maior escolaridade.

O Datafolha mostrou também naquela altura o aumento da resistência ao isolamento social amplo, que teria caído de 60% a 52% entre os primeiros três dias de abril e 27 de abril, enquanto a posição de “sair para trabalhar” teria passado de 37% a 46%.

A pesquisa revela uma população em que a perspectiva do bolsonarismo se mantém, mas migra progressivamente para os mais pobres. A perda de suporte é rápida entre os mais ricos/com mais escolaridade, aparentemente a turma que sustentou o bolsonarismo nas ruas desde 2015/2016, e em especial na campanha de 2018. Isso também reforça uma maior dependência do bolsonarismo em relação aos seus setores mais ligados a milícias e ao “partidarismo evangélico”. É inclusive provável, na medida em que são identificados nos atos realizados em Brasília mais e mais funcionários de ministérios e parlamentares bolsonaristas, que a concentração dos atos mais recentes na capital federal (em especial, as “domingueiras antidemocráticas”) seja a expressão de sedimentar essas manifestações entre assessores parlamentares e nos ministérios e órgãos públicos, como garantia de sucesso dos atos.

A perda de apoio entre os setores de maior escolaridade também pode expressar o chamado “fogo de barragem” da grande imprensa (em especial imprensa escrita e televisiva), que tem se mostrado fundamental para a “desconstrução” da imagem de Bolsonaro na medida em que pura e simplesmente divulga as informações (o que, cá entre nós, não fez tanto na campanha eleitoral quanto até a votação da reforma da Previdência no ano passado). As contradições entre “rachadinha” e combate à corrupção, defesa da lei e da ordem e conexão com as milícias do presidente e sua família, crítica à velha política e busca do apoio no chamado Centrão parlamentar, entre outras atitudes, servem para desconstruir rapidamente a imagem eleitoral que se construiu do então candidato Bolsonaro. Além disso, o governo federal está perdendo apoio exatamente entre os setores que são os chamados “formadores de opinião”, ou seja, aqueles que multiplicam o posicionamento.

A pesquisa da XP Investimentos, com informações capturadas entre 28 e 30 de abril, entretanto, é mais dramática para o governo Bolsonaro. A avaliação como ruim e péssimo vai de 20% no início do governo para 42% em 24 de abril, e daí a 49% uma semana depois. Por outro lado, a avaliação “ótimo e bom” passa de 40% a 31% entre o começo do governo e a penúltima semana de abril, e daí a 27% na semana seguinte. Abriu a chamada “boca do jacaré” para o governo Bolsonaro?