Levando em conta a biografia de Jair Bolsonaro, pode-se concluir que a sua falta de empenho em criar as condições de minimizar os efeitos da pandemia, ao contrário da maioria dos chefes de Estado, neste caso nada teve a ver com incompetência. Está mais com cara de ser proposital.
Bolsonaro foi o mais omisso chefe de Estado em relação à pandemia, que chamou de “resfriadinho” e nunca fez autocrítica, brigou com dois ministros que vinham atuando corretamente, reagiu com piadinhas infames ao ser instado a falar do assunto, nunca manifestou pesar, parecendo satisfeito com o desastre, estimulou a população, pelo exemplo, a ignorar a gravidade da doença, não usando máscaras, tocando nas pessoas e participando de aglomerações, fez reuniões para tratar apenas da economia e de como salvar os filhos, todos eles envolvidos em tenebrosas transações.
Como comparação, a Argentina, onde o presidente Alberto Fernández – que Bolsonaro chama de bandido – arregaçou as mangas e foi à luta, no dia 28/5 registrava o óbito de 10 pessoas por milhão de habitantes. Na mesma data, o Brasil registrava nada menos que 129 por milhão de habitantes. Em números absolutos, a Argentina registrou desde o início até agora, apenas 500 mortes. O Brasil vem registrando mais que o dobro em apenas 24 horas.
Para Bolsonaro, a questão econômica era e é a preocupação central, numa rendição às ideias de Guedes e do empresariado que ainda o sustenta na presidência. Neste sentido, uma pandemia que vitima especialmente os idosos e os pobres, propicia a redução das aposentadorias e dos recursos para programas sociais.
O que era tratado apenas com hipótese, ganhou ares de verossimilhança nas palavras da economista Solange Vieira, superintendente da Superintendência de Seguros Privados, do Ministério da Economia, e aliada de Paulo Guedes. Em reunião convocada pelo então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, no dia 17 de março, Solange abriu o jogo, causando estupefação entre os presentes: “É bom que as mortes se concentrem entre os idosos. Isso vai melhorar nosso desempenho econômico, pois reduzirá nosso déficit previdenciário”.
O teor da declaração, segundo o Estadão, foi relatado pelo epidemiologista Júlio Croda, que integrava o Ministério da Saúde, e confirmada por outros dois participantes da reunião, que preferiram permanecer no anonimato. Solange Vieira não deve ter expressado uma posição sua, individual, sem respaldo, e sim o que matutam Guedes e sua trupe, assim como Bolsonaro.
Revelada a indiscrição, Solange nega de pés juntos que tenha dito tal barbaridade, mas não convence. Não é difícil imaginar que a equipe econômica já tenha feito os cálculos do que o genocídio representará em termos de economia para os cofres públicos.
Preocupação com mortes, Bolsonaro parece não ter nenhuma. Pelo contrário, aparenta ter por elas um gosto especial. Quando parlamentar, em 1998, chegou a declarar: “[O país] Só vai mudar infelizmente quando um dia partirmos para uma guerra civil aqui dentro. E fazendo um trabalho que o regime militar não fez, matando 30 mil, começando pelo FHC. Não mandar pra fora. Matando.”
Pois bem, o Coronavírus deve ser o seu ídolo, já que neste fim de maio está registrando quase 30 mil mortes. Portanto, não é exagero dizer que ele tem parcela de responsabilidade sobre o genocídio.