Foi reveladora a demissão, na última segunda-feira, 29 de março de 2021, do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, pelo presidente Jair Bolsonaro. A nota oficial do ministério não revela o motivo e o signatário apenas agradece aos comandantes das três armas e diz encerrar o ciclo com a certeza do dever cumprido e de ter mantido o Exército, Aeronáutica e Marinha como órgãos de Estado.
O texto vale mais pelo que não explicita: primeiramente, a rejeição das Forças Armadas em abrigar o ex-ministro da Saúde, o general de brigada Eduardo Pazuello, tristemente famoso pela gestão calamitosa da epidemia de Covid-19 no país. Depois, a resistência do ministro da Defesa às investidas do presidente em transformar as Forças Armadas em instrumento de seu governo para apoiá-lo na decretação de um estado de sítio, antessala de um autogolpe. Ontem, 31 de março, já se confirmou também a troca dos comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica, com o general Edson Pujol à frente, pelo novo ministro, Braga Netto.
Vagando como um fantasma na esplanada dos ministérios, Pazuello foi cogitado sucessivamente para um ministério extraordinário da Amazônia, para o Programa de Parcerias em Investimentos (PPI) e, por fim, para algum cargo no Ministério da Defesa, este o último recurso de Bolsonaro, já sem o foro privilegiado. No entanto, havia resistência em recebê-lo estando ainda na ativa, o que causava desconforto no alto oficialato.
Junte-se o esvaziamento do pretenso “dream team” de Paulo Guedes – as últimas deserções foram André Brandão, do Banco do Brasil, e Wilson Ferreira Jr., da Eletrobrás, -, o pedido de demissão de Ernesto Araújo do Ministério das (não) Relações Exteriores e a saída inesperada do general Fernando, e temos o governo Bolsonaro enfrentando uma tempestade perfeita. Sem contar, é claro, a pandemia e a miséria assolando a população.
A reforma ministerial, com o troca-troca em nada menos que seis ministérios, não será suficiente para trazer um mínimo de estabilidade ao governo do ocupante do Palácio do Planalto. O capitão continuará acuado pelo apetite crescente do Centrão por cargos e verbas e tentará um equilíbrio cada vez mais precário para continuar agradando aos seus seguidores mais fanáticos, a esta altura um tanto quanto decepcionados com o abandono do combate à corrupção, que era personificado por Sérgio Moro, e com a pauta de costumes travada no Congresso.
Fato é que, além das crises sanitária e econômica, Jair Bolsonaro tem cada vez menos onde se amparar para manter seu mandato até o final de 2022. Os representantes do PIB já deixaram claro, em carta pública, que abandonaram o barco; o pedido de demissão do chanceler Ernesto Araújo, pressionado pelo Congresso, vai acender o sinal amarelo para os apoiadores ditos “ideológicos”; e a saída do ministro da Defesa, ainda um general de quatro estrelas da ativa, levará o presidente logo a perder o apoio também da ala militar, a despeito dos mais de seis mil cargos comissionados distribuídos entre oficiais das três forças armadas.
Seguirá Bolsonaro sozinho, lobo solitário desde sempre. E levará consigo os quatro zeros – não se esqueçam de Jair Renan – até o castelo de cartas que sempre foi o seu governo desabar por completo.
Resta saber, portanto, como se portará então o braço armado do bolsonarismo: os policiais militares, espalhados por todo o país em número superior ao das forças armadas. Abandonarão também o parceiro e incentivador de milícias? Ou darão suporte à sua nefasta tarefa, colocada em prática desde o primeiro dia de governo, de destruir todo o arcabouço democrático da nação e se perpetuar, sem a necessidade de passar pelo crivo eleitoral, na presidência? O jogo para valer ainda não começou. A crise ainda vai escalar. Preparem-se.