O vice-presidente general Hamilton Mourão assustou muitas pessoas no início desta semana, referindo-se às ruas do Brasil como “o espaço de batalha” em apoio aos reclamos do presidente de dominar as ruas. Ao que parece ele quer se livrar da aura, que talvez nunca tenha existido, de ser um freio ao ideário autoritário do seu chefe. Ou talvez esteja com medo da cassação da chapa pelo Tribunal Superior Eleitoral-TSE e ache que com suas ameaças de retrocesso autoritário possa influenciar a decisão do TSE.

As declarações tanto do vice-presidente quanto do presidente vão na direção de criar um clima para que os brasileiros acreditem que o Palácio do Planalto está ameaçado por terroristas domésticos, incendiários, bandidos, saqueadores e assassinos, todos eles financiados por grupos internacionais supostamente de esquerda.

Porém se olharmos as pesquisas de opinião, elas mostram que há uma queda nas taxas de aprovação do governo, por uma conjunção de fatores como: a má administração da pandemia, a falta de ação para atenuar a pior crise econômica da história do Brasil e uma evidente incapacidade de governar.

O isolamento político, a transformação do herói da Lava Jato em desafeto e as ameaças das investigações sobre as fakenews estão irritando o presidente Jair Bolsonaro. A ameaça da perda de controle sobre a indústria das fakenews, o seu principal instrumento de fazer política, e a obsessão paranoica com qualquer ameaça de um político ou ministro que ganhe reconhecimento na sociedade, têm levado o presidente a discursos cada vez mais dirigidos à sua base de apoio radical para assegurar os 20% a 25% de votos que o levem para o segundo turno em 2022 e possa reproduzir a estratégia de 2018 de antipetismo.

Esse contexto de isolamento político já levou o presidente a começar a procurar o “Centrão” para garantir uma base política no Congresso que lhe dê segurança contra o processo de impedimento. Esse movimento o joga ainda mais para longe de uma parte da opinião pública que votou nele em 2018 e que começou se afastar com a saída do Moro.

A irritação quase infantil do presidente e a sua reaproximação do vice-presidente, que sempre foi a favor da negociação com o “Centrão”, significa que só resta a ele uma saída: a economia pós-pandemia. Ele não é um troglodita em política, sabe fazer os seus cálculos, e nesses cálculos entram o conhecimento que ele traz do baixo clero da Câmara dos Deputados, do qual fez parte durante 30 anos. Sabe que esses deputados vão para onde o vento leva.

Porém, acreditar que o plano econômico do Guedes vai levar ao crescimento é uma aposta de alto risco e vai levar muito tempo. Por isso, politicamente optou por criar fatos, reais ou virtuais, que possam diminuir o esvaziamento da sua base política. Um movimento já começou a ser feito com o “Centrão”. O segundo movimento vai na direção de criar a percepção na opinião pública de que existe governo. Para isso, cada vez mais arregimenta os militares para a administração pública civil. São cerca de três mil militares alocados nos mais diversos cargos da administração federal, como mostrou o sítio “Poder 360’, com cerca de 1,6 mil cedidos pelo Exército, quase 700 pela Marinha e mais de 600 pela Aeronáutica. Esses números não incluem reservistas, nem como os oriundos das Polícias Militares estaduais. Isso daria ao governo, dada a imagem dos militares na sociedade, a percepção de sua seriedade e honestidade.

Mas para que isso dê certo tem que ser encontrado algum objetivo político que dê alguma noção de unidade a um governo completamente perdido. Com o “Centrão” pode ser caro para a sociedade, porém é fácil de resolver para o governo. Para os militares, uma parte está resolvida com base nos ganhos de salário decorrentes dos cargos em comissão, de direção nas empresas estatais, e para os que permaneceram nos quartéis, os ganhos gerados pelas recentes reestruturações da carreira e reformas previdenciárias. Também reflete um aumento do poder político de militares em posições pouco relacionadas a suas competências. Para dar sentido de missão, usa a velha tática de criar um inimigo, no caso, interno, já que não pode avançar tanto em direção à China.

Daí a necessidade de unificar o discurso do vice-presidente e do presidente para a ameaça da baderna interna e o uso da intervenção militar. Daí a criminalização das manifestações pró democracia. O fascismo e o nazismo já fizeram isso quando culparam os comunistas pelo incêndio do Reichstag, ou quando fizeram o atentado ao show do Rio Centro que não conseguiu condenar os comunistas porque a bomba explodiu no carro dos agentes do DOI-CODI.

As chances de Bolsonaro ser reeleito estão diminuindo. Essa é uma fonte de perigo. Cada vez mais ele vai ficar desesperado. Com a pressão sobre a indústria das fakenews, a unificação da base de apoio dos militares passa pela política dos fakefacts fascistas: provocações, violências, agressões e destruição do patrimônio público. Tudo feito por agentes provocadores para jogar a culpa nos movimentos de oposição.