A nova legislação que permite a formação de federações partidárias deve ser saudada como um avanço democrático. Diferentemente das coligações eventuais, que com frequência juntavam partidos com posições opostas por conveniências eleitorais localizadas, contribuindo para despolitizar os processos eleitorais, as federações pressupõem um funcionamento conjunto por quatro anos. Se por um lado isso é um avanço, por outro coloca novos desafios.
Costuma-se usar o exemplo da Frente Ampla Uruguaia como paradigma do que seria uma federação entre os partidos da esquerda brasileira, mas isso não me parece tão simples. Se por um lado a federação traz vantagens óbvias, como concentrar os votos da esquerda sem desperdícios e facilitar a interiorização com maior possibilidade de superação de cláusulas de barreira nos municípios, por outro traz desafios novos e complexos.
A esquerda brasileira tem diversas tradições e se construiu com táticas políticas muito distintas. Se construir um programa comum para um período de quatro anos na disputa de um governo é tarefa mais viável, construir uma ação tática comum em quatro anos com partidos de tradições tão díspares não será tão fácil assim. É preciso lembrar que uma federação implicaria em unificação de chapas em todas as disputas eleitorais do período de quatro anos. Implicaria em relação comum com inúmeros governos em um cenário onde é frequente partidos de esquerda integrarem governos aos quais outros partidos de esquerda fazem feroz oposição.
O sistema eleitoral de lista aberta não facilita porque permite que um partido, dentro de uma federação, concentre sua campanha em um candidato, podendo, dessa forma, com menos votos que seu parceiro, levar o mandato. Essa dinâmica tende a explodir qualquer federação quando isso venha a ocorrer.
Em linhas gerais, os dois partidos que não têm problemas com cláusula de barreira e que poderiam ancorar uma federação partidária seriam o PSOL e o PT. Partidos de larga tradição como o PCdo B e o PCB precisam se integrar a uma federação como forma de manterem seu funcionamento interno sem restrições legais, inclusive com eventuais mandatos obtidos.
A possibilidade aberta pela legislação obriga os partidos a se movimentarem nesse debate, mas é necessário discutir bem os termos e os acordos que ancorarem uma federação porque nada pior que esta federação explodir na esquina seguinte sem possibilidade de divórcio amigável antes de transcorridos os quatro anos.
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Ilustração: Mihai Cauli e Revisão: Célia Bertone
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