Jânio e Brizola mestres das faíscas verbais

Abrão Slavutzky escreveu “Humor é coisa séria”, onde afirma que “sorrir é uma necessidade diante dos assombros e das tristezas da vida”. Como diz na contracapa de seu livro, parafraseando Italo Calvino: “num mundo pleno de tragédias, devemos tentar identificar aquilo que, em meio ao trágico, é tragicômico ou cômico, e preservar o humor”. Márcio Bueno é um radical do humor. Seu livro “Faíscas Verbais” consegue transformar frases ditas em momentos importantes da vida em pérolas do humor. São dele os trechos que trazemos hoje para fazer o leitor sorrir, ainda que seja um sorriso meio amarelo.

Jânio e as aparências

Na primeira vez em que disputa a prefeitura de São Paulo, em 1953, Jânio Quadros tem como principal adversário o professor Cardoso (em 1985, ele voltaria a concorrer a prefeito de São Paulo com outro professor Cardoso, o que mais tarde chegaria a presidente da República). Durante a campanha eleitoral, o professor Cardoso da década de 50 (Francisco Antônio Cardoso) costumava dizer: “Jânio é um homem feio, magro, demagogo, mal vestido, mal barbeado, ou seja, é um personagem que nada tem a ver com a dignidade do cargo a que aspira”. Jânio, por sua vez, e surpreendentemente, passa a dizer nos comícios exatamente o contrário a respeito de seu oponente: “trata-se de um homem bem apessoado, rosto bonito, dentes brancos, veste-se impecavelmente, elegante e simpático”. Mas aí vem a conclusão:

– Se estivéssemos participando de um concurso de beleza, eu garanto a vocês que retiraria a minha candidatura.

Brizola e a casca de banana

Em 1982, já na fase final da ditadura militar, foram realizadas eleições diretas para governadores em todo o país. No Rio de Janeiro, concorreram Moreira Franco, pelo PDS, partido da ditadura, Leonel Brizola, pelo PDT, Miro Teixeira, pelo PMDB, partido do então governador Chagas Freitas, Sandra Cavalcanti, pelo PTB, e Lysâneas Maciel, pelo PT. Embora fosse o candidato do governador do Rio, Miro não escancarava esse fato em público, uma vez que Chagas Freitas tinha se tornado sinônimo de corrupção no Estado, da mesma forma que Paulo Maluf em São Paulo. Durante a campanha, o SBT (que na época se chamava TVS) decidiu fazer um debate ao vivo com os candidatos. A certa altura, Hilton Franco, mediador do debate, pergunta a Brizola quais eram seus planos para a agricultura no Rio de Janeiro. Brizola começa dizendo que conhecia muito bem o assunto por ser natural do Rio Grande do Sul, um estado agrícola. E interrompe a fala para dizer:

  •  Aliás, creio que todos os candidatos aqui são de fora do Rio de Janeiro…

No mesmo instante, Miro Teixeira intervém:

  • Todos, não, eu sou do Rio de Janeiro…

Nisso, Brizola arremata, como se tivesse jogado uma casca de banana exatamente para Miro escorregar:

  • E daí, o Chagas Freitas também é.
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Ilustração: Mihai Cauli  e Revisão: Celia Bartone
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