Para gerar manchetes, parece que no Brasil há uma inversão de valores: os meios são valorizados e os fins são desprezados. O bem-estar dos homens é varrido para debaixo do tapete.

Algo estranho a ser combatido

Um vício, ler os jornais todas as manhãs. Ater-me às notícias econômicas. Entender um pouco o que se passa e o que pode vir. Acho que estou equivocado. Na verdade, pode haver uma indução a muitos erros e visões distorcidas. Conjunturas são interpretadas, dados são escondidos, textos refletem mais a visão do redator do que a realidade. Não há imparcialidade.

Neste final de ano e início de 2025, há uma profusão de artigos mostrando que o Brasil está em situação catastrófica e a Argentina em posição altamente privilegiada. Num pequeno esforço para ver os dados, encontro outra realidade.

No início de 2024, o FMI previa que a economia da Argentina iria crescer 2,8% e a do Brasil, menos de 2%. O que se observou, no final do ano, é que a economia argentina diminuiu quase 4% enquanto que a brasileira cresceu mais de 3,6%.

Se for analisado o bem-estar social, ou seja, o nível de pobreza da sociedade, observa-se que a Argentina atingiu, com medidas de austeridade draconianas, 53% de sua população, enquanto que o Brasil teve uma redução significativa da pobreza e da fome.

Analisando a questão da falta de empregabilidade, observa-se que na Argentina vem crescendo, já passando dos 7%, enquanto que no Brasil diminuiu de mais de 10% em fins de 2022 para 6% no último dezembro.

Mas vamos para o índice que é a obsessão dos analistas de mercado: a inflação. Enquanto a inflação brasileira se mantém abaixo dos 5% ao ano, na Argentina, em novembro, foi de 2,4% ao mês, fazendo com que a taxa anual se aproximasse dos absurdos 170%.

Com esses números, fica claro que há um forte desvirtuamento. Grupos de direita, a grande mídia e o mercado financeiro tentam vender uma visão em que nada disso é relevante. O fundamental seria criar ajustes fiscais e perseguir superávit primário nas contas públicas.

Gerar emprego e renda e mudar a distribuição de recursos em prol dos menos favorecidos não são importantes. Vai gerar inflação e desequilíbrio fiscal, não interessa se vem resgatar a dignidade de um povo.

Uma completa inversão de valores. Não se visam fins, os meios é que são importantes. As condições de vida das populações pouco importam, o fundamental é retirar o Estado da economia, fazer com que os únicos interesses a serem ressaltados sejam os de mercado, principalmente o financeiro.

Nesse ponto, encontram um argumento para a economia do país vizinho. Teve superávit primário após 13 anos. Eles se esquecem de dizer à custa de quê. O nosso déficit é irrelevante, menos de 0,1% do PIB.

Leio com atenção um artigo que saiu no blog Terapia Política, em 7 de janeiro de 2025, de Marcos de Queiroz Grillo, “Apesar das manchetes, os indicadores econômicos brasileiros mostram força.

Um levantamento muito interessante das dificuldades que se está enfrentando no país em diferentes áreas, dada a resistência da oposição ensandecida. Atendo-me apenas aos resultados econômicos alcançados no governo Lula, governo que encontra o país em situação lastimável, reproduzo os pontos que ele apresenta:

Os números do segundo ano do governo Lula 3 que não vão para as manchetes:

  1. Crescimento do PIB em 2023 de 3,2% e em 2024 3,5%.
  2. Projeção de crescimento da economia em 2024 sobe de 3,2 para 3,5.
  3. Taxa de desemprego 6,1%, menor taxa da história.
  4. A massa de rendimento real tem novo recorde, chegando a R$ 332,7 bilhões. O rendimento real habitual de todos os trabalhos (R$ 3.285).
  5. Crescimento da indústria de 3,6%em 2024, maior em 10 anos.
  6. Crescimento de 75% do emprego na indústria, destes 55% são jovens.
  7. Segmentos de alta tecnologia crescem 5%, acima da indústria de transformação, que vai crescer 3,6%.
  8. A taxa de investimento como proporção do PIB passou a ser 18%.
  9. O Brasil se tornou o 2º maior receptor de investimentos estrangeiros diretos do mundo em 2024.
  10. Investimento em infraestrutura saiu de R$ 188 bilhões em 2022, para R$ 260 bilhões em 2024.
  11. Com o Plano Mais Produção, a Nova Indústria Brasil (NIB) disponibilizou R$ 507 bilhões de crédito para investimentos. BNDES, FINEP, EMBRAPII, CEF, BB, BASA e BNB estão juntos para estimular uma Indústria Mais Inovadora e Digital, Exportadora, Verde e Competitiva.
  12. BNDES aumentou o volume de desembolso de R$ 98 bilhões em 2022, para R$ 148 bilhões em 2024. O crédito para a indústria cresceu 262% em 2024.
  13. Com a Nova Indústria Brasil (NIB), Novo PAC e PTE, o setor privado já anunciou investimentos de R$ 2,3 trilhões.
  14. Finep bateu recorde e ultrapassa R$ 10 bi em financiamentos. Os recursos financeiros liberados pela Finep em 2024 representam o dobro do montante financiado em 2023. O desempenho também representa um crescimento três vezes superior em relação ao resultado de 2022.
  15. Com a Nova Indústria Brasil estimulando a agroindústria, a taxa de crescimento da agroindústria teve o melhor resultado em 14 anos, crescimento de 4,2% em outubro, e 2,7% no acumulado.
  16. Linhas branca e marrom da indústria registraram o maior crescimento da produção e vendas nos últimos 10 anos, 25%.
  17. Com o Mover, programa da Nova Indústria Brasil, o setor automotivo bateu recorde nas vendas, crescimento de 15% em 2024. A produção cresceu 11%, maior crescimento dos últimos 10 anos.
  18. Máquinas e equipamentos estão puxando o crescimento industrial, crescimento de 8,3% em 2024.
  19. O setor de bens de consumo duráveis cresceu 9,8% em 2024. São mais bens como automóveis, geladeiras, TVs, fogões, máquinas de lavar, etc., chegando ao povo.
  20. No ranking mundial de produção industrial, o Brasil avançou 30 posições, saltando de 70º para 40º.
  21. Varejo chega ao fim do ano com alta de 12,2% nas vendas na comparação com 2023: entre os itens mais procurados estão: os eletrônicos (alta de 25,9% nas vendas ante 2023); os brinquedos (+24%) e as roupas e os acessórios (+13%). Setor alimentar, 18,4%.
  22. Depois de mais de 40 anos, foi aprovada a Reforma Tributária, que estimula investimentos e exportações. Estima-se que a reforma gerará um crescimento adicional da economia de 12% a 20% em 15 anos. Hoje, esses 12% representariam R$ 1,2 trilhão a mais no PIB de 2022.
  23. Taxa de pobreza caiu para mínima histórica: 27,4%.
  24. A taxa de miséria caiu para a mínima histórica. Parcela de brasileiros miseráveis caiu para 4,4%.
  25. Amazônia tem menor taxa de desmatamento em nove anos. Taxa de desmatamento caiu 77,2%% no Pantanal e 48,4% no Cerrado.
  26. A inflação ficou abaixo das expectativas feitas pelo mercado. O IPCA-15 acumulado em 2024 deve ser 4,71%, as expectativas do mercado eram de alta de 4,82%.”

Com esses resultados, difícil não constatar que se está na direção correta, pelo menos aderente à proposta pelo plano de governo apresentado.

Temos que deixar de ser o paraíso para os rentistas, de ter uma taxa de juros real acima dos 7,5% ao ano – um absurdo. Temos que ter a coragem de enfrentar o tripé do mal: grupos de direita, mídia enviesada e mercado financeiro.

Um governo voltado para as classes menos favorecidas deve se centrar em maior nível de emprego, em aumentar os rendimentos médios, em trazer investimentos geradores de riqueza física, em aumentar a competitividade da nação, permitindo uma inserção mundial mais adequada.

Como disse em artigo anterior, mudar para:

  1. Elevar a banda de inflação para um patamar que não asfixie os investimentos governamentais, com responsabilidade, voltados para as necessidades do desenvolvimento mais harmônico e redistributivo do país;
  2. Admitir um déficit primário de 0,5% para dar uma folga ao governo nos investimentos necessários para aprofundar a recuperação da economia. Não só emprego, mas é fundamental se voltar para a saúde, educação, ciência e tecnologia, além da recuperação da infraestrutura, com o novo PAC.
  3. Continuar insistindo na revisão da questão tributária. Grandes fortunas têm que ser taxadas e contribuir para o desenvolvimento nacional.
  4. Evitar ficar nas mãos dos rentistas e seus interesses. A queda de braço no mercado cambial e de investimentos não pode direcionar as políticas públicas.
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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política. 

Ilustração: Mihai Cauli  e Revisão: Celia Bartone
Leia também “A escalada irresponsável do câmbio“, de Adhemar Mineiro.