Pesquisa Atlas mostra o curioso paradoxo do sistema eleitoral, no qual o candidato preferido pela maioria em confrontos diretos pode ser excluído da disputa final. 

De acordo com a última pesquisa Atlas para a Prefeitura de São Paulo, divulgada em 23 de setembro de 2024, se a eleição fosse realizada hoje, Guilherme Boulos avançaria para o segundo turno, disputando contra Ricardo Nunes ou Pablo Marçal. No cenário de segundo turno, a pesquisa indica que Boulos venceria qualquer um dos dois adversários.

Além disso, a pesquisa revela um cenário intrigante envolvendo Tábata Amaral e Pablo Marçal. Segundo os resultados, Tábata seria a vencedora de Condorcet, ou seja, em um confronto direto com qualquer outro candidato no segundo turno, ela venceria. Por outro lado, Pablo Marçal seria o perdedor de Condorcet, o que significa que ele perderia para qualquer outro candidato em um confronto direto.

Para checar essa afirmação sobre esses dois candidatos, o leitor pode conferir aqui os resultados dos confrontos diretos em um eventual segundo turno entre os quatro principais candidatos, divulgados pela pesquisa Atlas, desconsiderando as abstenções:

Boulos (51,3%) x Nunes (48,7%)
Boulos (53,5%) x Marçal (46,5%)
Nunes (62,9%) x Marçal (37,1%)
Tábata (50,5%) x Boulos (49,5%)
Tábata (57,1%) x Nunes (42,9%)
Tábata (56,9%) x Marçal (43,1%)

Antes de discutir esses resultados em maior profundidade, é fundamental observar que eles não representam uma evidência cabal de que esses dois candidatos sejam de fato o vencedor e o perdedor de Condorcet, pois seria necessário ter informação sobre os confrontos diretos contra todos os demais candidatos que não foram disponibilizados pela pesquisa. Além disso, a margem de erro não foi considerada, o que significa que não podemos descartar a hipótese de que Boulos supere Tábata em um confronto direto, tornando-se o verdadeiro vencedor de Condorcet.

Paradoxalmente, a mesma pesquisa indica que, embora Tábata seja a vencedora de Condorcet, ela não chegaria ao segundo turno. Esse fato expõe uma limitação crítica do sistema eleitoral brasileiro: um candidato preferido pela maioria em confrontos diretos pode não ir nem para o segundo turno.

Se a eleição em São Paulo fosse realizada em um único turno, como ocorre em cidades com menos de 200 mil eleitores, o cenário poderia ser ainda mais problemático. Nesse formato, o sistema preserva as mesmas fragilidades, não apenas falhando em não eleger um vencedor de Condorcet, mas também permitindo que um perdedor de Condorcet, como Pablo Marçal, pudesse vencer. Note que seria um cenário plausível dado que a pesquisa indica que Marçal está a apenas 7,4 pontos percentuais do primeiro colocado.

Embora Tábata seja a vencedora de Condorcet, uma parcela significativa do eleitorado não a vê como uma opção suficientemente forte para receber o voto no primeiro turno. Ela teria apenas 10,9% das intenções de voto no primeiro turno. Isso sugere que, apesar de ser preferida em confrontos diretos, Tábata ainda não conseguiu consolidar uma base de apoio sólida o suficiente para garantir sua passagem à fase decisiva da eleição.

Outro ponto relevante é o impacto da rejeição nas campanhas. Para ser um vencedor de Condorcet, um candidato deve ter baixa rejeição. Como Tábata ocupa uma posição mais modesta nas pesquisas, ela tem sido menos alvo de ataques negativos. Resta saber se ela continuaria a ser a vencedora de Condorcet caso sua posição melhorasse e os demais candidatos começassem a direcionar críticas a ela.

A Teoria da Escolha Social é uma área interdisciplinar que estuda como as preferências individuais de uma sociedade podem ser agregadas para formar decisões coletivas. Ela investiga diferentes sistemas de votação e as regras que transformam escolhas individuais em decisões sociais justas e representativas.

Um exemplo de sistema eleitoral alternativo que poderia ser adotado no Brasil é o voto por aprovação (Approval Voting), utilizado pela Sociedade Acadêmica de Escolha Social para eleger seu presidente. Desenvolvido por Steven Brams e outros pesquisadores, esse método permite que os eleitores aprovem (votem) quantos candidatos desejarem, em vez de escolher apenas um. O candidato com o maior número de aprovações (votos) é eleito. Embora o método quase sempre eleja o vencedor de Condorcet, ele não garante esse resultado em todas as situações. Ainda assim, é amplamente considerado um sistema que tende a selecionar o candidato mais aceitável para a maioria, oferecendo uma alternativa mais inclusiva e representativa aos sistemas tradicionais.

Uma das grandes vantagens desse método é que ele desincentiva campanhas negativas, como as que estamos presenciando nessas eleições para prefeito pelo país. Nesse sistema, os eleitores podem aprovar mais de um candidato, o que incentiva os concorrentes a evitar ataques diretos que poderiam alienar os eleitores, os quais poderiam aprovar tanto eles quanto seus rivais. Essa lógica torna a estratégia de ataque menos eficaz, promovendo campanhas mais positivas e inclusivas.

Dessa forma, o voto por aprovação pode ser uma alternativa interessante para tornar as disputas eleitorais para prefeito no Brasil menos custosas, por ser de apenas um turno. Inclusive, também mais construtivas, já que teriam o foco em apresentar propostas e soluções, em vez de simplesmente atacar os adversários.

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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política. 

Ilustração: Mihai Cauli
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