Bolsonaro está insatisfeito com os planos que recebeu de auxiliares para a preparação do golpe. Chama civis, militares e milicianos para uma reunião.

Vão fazer o Manual do Golpe, com um passo a passo, para que nada dê errado. O gabinete está cheio de gente do núcleo duro e de parte do núcleo meio mole.

Um general aparece na reunião de farda, apesar de estar na reserva, e diz que o plano deve ter um manual escrito e um vídeo com um tutorial.

Esse general é quem entrega a Bolsonaro um exemplar de A Arte da Guerra, de Sun Tzu, mas Bolsonaro não gosta.

– Chinês não me ensina a dar golpe.

– Mas guerra é guerra – rebate um miliciano.

– Mas isso não é guerra, é um golpe, imbecil – grita Bolsonaro.

Estão debatendo se iriam ou não adotar os ensinamentos do livro, quando um cabo fardado entra na sala.

– Sou o cabo, aquele do jipe citado pelo Dudu.

Ouve-se um uau no gabinete, e Bolsonaro larga o livro de Sun Tzu e pede que o cabo fale. O cabo fala:

– Posso mostrar no manual como entrar pelos fundos do Supremo sem a necessidade de um jipe.

– Vocês vão chegar a pé? – pergunta um general.

– Vamos num Chevette.

Outro general faz cara de não sei não, e Dudu, que está na sala, diz que o cabo e o soldado podem segurar as pontas e tomar o Supremo.

Bolsonaro passa o livro de Sun Tzu a Ciro Nogueira, que passa para o Queiroz, que abre o livro numa página do meio e finge que lê.

O cabo retoma a fala e aponta o dedo para um soldado, que mexe num celular num canto da sala dedicada ao Gabinete do Ódio.

– Ele vai desviar a atenção pintando o meio-fio dos fundos do Supremo.

Bolsonaro ergue a sobrancelha esquerda e movimenta a cabeça em sinal de contrariedade.

O cabo chama o soldado, que vai para o meio da sala com um galão de tinta branca e uma brocha.

– Mostre – diz o cabo.

O soldado começa a pintar o rodapé da sala diante do espanto geral de civis, militares e milicianos.

Vai pintando todo o contorno da sala, meio agachado, e o que se vê é uma lambuzeira de tinta, com respingos para todo lado.

– Vocês enlouqueceram – disse um general, este de pijama, mas com um quepe de general.

Bolsonaro grita para que o soldado pare e o rapaz se assusta e joga a lata de tinta no colo do Queiroz, que leva um susto e joga o livro de Sun Tzu para o alto, e o livro cai dentro da lata.

Dudu, que é o chefe do cabo e do soldado, diz que é preciso ensaiar melhor, e Bolsonaro grita:

– Vamos desistir do golpe.

– E fazer o quê? – pergunta um miliciano.

– Vamos ganhar a eleição no voto.

Foi um ohhh na sala;

Augusto Heleno dá um pulo – de susto, de felicidade, de espanto ou de incredulidade – e enfia o pé na lata de tinta e cai sobre Queiroz. Tentam desentalar o pé, que está prensado com o livro, e alguém consegue puxar a lata. A lata vira no chão e a tinta se esparrama. O gabinete vira um pântano branco. Bolsonaro diz que assim não tem como aplicar um golpe e sai porta afora gritando:

– Não vai ter golpe, não vai ter golpe!  (Original pulicado no Grifo No. 23)

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Ilustração: Santiago

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