Falta pouco: o último turno das eleições
O tempo passa e as cartas parecem imutáveis na certeza da eleição de Lula presidente e o início de um novo tempo de esperança e realismo.
A diferença em número de votos existe e é suficiente para consagrar uma centro-esquerda que prometa, a partir do Executivo, distinta perspectiva para 33 milhões de brasileiros com fome, esforço para desfazer as desigualdades em uma sociedade ansiosa por paz democrática, que saiba desmentir as inverdades de um desgoverno de quase quatro anos.
É surpreendente que, em meio a tantos erros, esse desgoverno ainda obtenha 50 milhões de votos nas eleições.
Serão tantos milhões cativos de uma direita insuscetível de convencimento?
Veremos, com um Bolsonaro sem caneta.
De início, entretanto, será talvez capaz de mobilizar opiniões de uma classe alta, que com ele só ganhou, e uma classe média ignorante de seu papel e destino, no país desigual que criamos em duzentos anos de independência.
Fundado em parâmetros da corte de inspiração portuguesa, o mundo político submete-se tradicionalmente ao Poder central, na expectativa de acesso, corrupto ou não. São condes e barões assinalados, que corroem o país por ignorar desigualdade e pobreza, onde a educação é secundária para a maioria e privilégio de uns poucos.
Que fazer, diante de um Congresso eleito por esses 50 milhões de brasileiros ignorantes das agruras da desigualdade?
Que fazer com as distorções do Orçamento e da Lei que o aplica?
A herança, desta vez de fato maldita, necessita desmontagem, onde é fato o teto de gastos a ser contornado necessariamente por projeto de Lei Constitucional e apoio de dois terços exigido. Como desmontar o “orçamento secreto”, que beneficia parlamentares à margem de políticas públicas?
De início o Parlamento eleito estará imediatamente sujeito a lideranças ressentidas de Bolsonaro, Lira “et caterva”.
Trato do começo de conversa, sem subterfúgios.
Lula tem a necessária experiência, e terá de contar com um PT desacostumado com a negociação parlamentar e precisado de somar uma soma que inclui uma parte da direita a ser convencida de que, de fato, são “centro” e devem trabalhar com um Governo de “centro-esquerda”.
A fome vem em seguida. O socorro há de ser imediato, pois “quem tem fome tem pressa”.
O conservadorismo não tem história de reformas sem um contencioso frontal e eventualmente agressivo: uma reforma tributária está no cerne do possível movimento de redução de desigualdades, mas deve encorajar o crescimento em primeiro plano, com investimento público e segurança para o investimento privado, primeiramente na educação, seguido na livre expressão cultural, como forma de contornar possível desentendimento.
Tal foi a constatação histórica em países europeus, no imediato pós-guerra, nos quais gastos sociais foram objeto de novas receitas para propiciar mudanças substanciais na educação e na saúde. Assim aconteceu no Oriente, entre tantos, com o fenômeno sul coreano.
No Brasil haveremos de reiniciar pelas mesmas áreas, para em ato contínuo tratar:
(a) da infraestrutura, sobretudo em energia e transporte, de maneira a garantir a crescente capacidade exportadora da produção agropastoril, com melhor atendimento ao pequeno e médio produtor;
(b) da reforma trabalhista, que incremente a capacidade de emprego e induza igualmente o investimento privado, e
(c) da reforma previdenciária, essencial para garantir o atendimento do processo de envelhecimento e consequente aposentadoria de milhões de brasileiros.
A tarefa é imensa e não deve ignorar a reforma administrativa, para contornar ou equilibrar despesas que atualmente absorvem excessiva parte da renda nacional.
Lula, com o apoio da centro-esquerda, saberá certamente manejar a possível personalidade conservadora do Congresso e, sem qualquer sombra de dúvida, deverá garantir o respeito institucional e o funcionamento democrático das instituições do Estado em seu papel renovado de indutor do desenvolvimento sustentável.
Insistir na educação como motor do desenvolvimento; promover a livre e crescente expressão cultural nesse contexto; investir e atrair o investimento privado na infraestrutura; assegurar finalmente o respeito ambiental, como forma de expressão da soberania no esforço de cooperação internacional são as tarefas.
Aí está! Um novo país nos espera!
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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política.
Ilustração: Michai Cauli e Revisão: Celia Bartoni
Clique aqui para ler “Nunca fui lulista ou petista“, publicado pelo autor.