Visão Geral  publicada na Carta de Conjuntura do IPEA

O desempenho da economia brasileira tem surpreendido positivamente nos últimos meses. As expectativas para o crescimento econômico têm sido sistematicamente revistas para cima, em meio a uma inflação declinante desde o início do ano. Contribuíram para este resultado tanto fatores externos quanto internos.

No plano internacional, o primeiro aspecto relevante diz respeito à reabertura da economia chinesa e resiliência das economias ocidentais ante o cenário de aperto monetário, elevando a demanda externa por commodities brasileiras.

O segundo aspecto relevante refere-se ao aumento da participação de mercado dos produtores brasileiros no comércio internacional de soja e petróleo, antes atendido por outros concorrentes. Soma-se a isso o fato de que, embora as cotações das commodities estejam em queda, seus preços relativos permanecem elevados, superiores aos do período pré-pandemia, reforçando a competitividade da soja e do petróleo brasileiros.

No plano doméstico, a demanda interna tem sido influenciada por duas forças distintas e que vão em sentidos opostos. A primeira refere-se aos efeitos defasados da política monetária contracionista. A segunda vincula-se à política fiscal contracíclica, compensatória e de caráter expansionista.

No embate entre essas duas forças, a manutenção por período prolongado de taxas de juros muito elevadas por parte da autoridade monetária configura-se como o vetor que pressiona o nível de atividade para baixo, uma vez que as taxas de juros no mercado de crédito alcançaram o valor médio anualizado de 45%.

Por sua vez, as medidas fiscais implementadas desde a transição de governo correspondem ao vetor que impulsiona o nível de atividade econômica para cima, auxiliando a sustentação da renda das famílias, além de viabilizar os investimentos públicos e o consumo do governo.

Com efeito, o poder de compra da massa de rendimentos do trabalho tem crescido substancialmente, sobretudo quando são considerados os efeitos dos benefícios sociais, ainda que essa expansão tenha se dado a taxas decrescentes nos últimos meses.

Não obstante, dois elementos geram incertezas sobre o desempenho da economia brasileira no futuro próximo. O primeiro decorre da fragilidade financeira das famílias, endividadas em linhas de crédito caras e com o maior comprometimento para o pagamento do serviço da dívida (juros e amortização) desde 2007. No que se refere ao segundo, chama a atenção o alto custo para financiar capital de giro das empresas, sugerindo, igualmente, uma piora dos indicadores de fragilidade financeira, especialmente no setor varejista.

Um aspecto peculiar do período recente refere-se ao aumento nas quantidades exportadas de commodities, simultaneamente a uma queda de seus preços internacionais.

Nota-se, ademais, que a economia brasileira tem experimentado um processo de valorização cambial. Tal fato é resultante de múltiplos fatores. O primeiro está relacionado ao aumento da liquidez internacional que, associado ao elevado diferencial entre juros domésticos e externos, pressiona o câmbio para baixo. O segundo decorre de maiores fluxos comerciais de câmbio, enquanto o terceiro remete a uma melhora, na margem, dos fluxos de investimento direto no país.

Essa deflação de commodities, conjugada à valorização cambial, tem sido importante fator na redução das pressões inflacionárias no último trimestre. Com efeito, há uma deflação dos preços no atacado que contribui para a desinflação dos preços ao consumidor.

Diante desses fatos, a perspectiva de início de trajetória de queda paulatina na taxa de juros Selic no segundo semestre do ano deve incidir positivamente sobre os gastos privados, sobretudo em 2024.

No lado da oferta, o setor industrial vem de processo de histerese, em que diversos ramos continuam operando com nível de produção menor que no período pré-pandemia. Chamam especial atenção o caso dos bens duráveis e, sobretudo, o dos bens de capital, cujas quedas na margem foram bastante expressivas. Tais fatos sugerem a existência de uma baixa demanda por bens industriais e um baixo dinamismo dos investimentos privados.

Por sua vez, o setor agropecuário tem conseguido escoar a colheita da supersafra no segundo trimestre do ano, mantendo o vigor usual, ainda que esse dinamismo não deva se verificar com a mesma intensidade nos meses subsequentes.

Dessa forma, observamos que a conjuntura econômica tem um cenário externo favorável tanto para a demanda por commodities brasileiras quanto para o processo de desinflação observado nos índices de preço. O mix de política econômica que prevalece esse ano junta política monetária contracionista e política fiscal atuando de forma compensatória e anticíclica. Essa conjugação de fatores justifica a revisão de projeções no sentido de melhor perspectiva para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e para a redução da inflação. (Veja o estudo completo na  Carta de Conjuntura No. 59, IPEA)

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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política. 

Ilustração: Mihai Cauli
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