Pequeno dicionário eleitoral de significados idiossincráticos sazonais de períodos eleitorais para entender o furdunço político brasileiro

Aliança Política: sf. É como o casamento entre um crocodilo e um leão para garantirem a beira de um rio. No começo, tudo bem. Passada a eleição, um tenta levar o outro ao seu habitat para devorá-lo.

Campanha: sf. Disputa pelo voto alheio em que pode tudo, menos perder.

Centro: sm. O meio entre dois polos. Espaço político formado por gente que, ao mesmo tempo, a direita diz ser de esquerda e a esquerda diz ser de direita. Tipo um sujeito que não pode entrar no clube porque é mal vestido mas também não pode ficar no lobby porque é só para os empregados.

Corrupção: sf. Coisa que uns candidatos dizem combater. Outros, dizem ser contra. Mas uns e outros mudam de ideia dependendo do quanto lhe ofereçam.

Direitista: sf. Por aqui, pessoas que querem andar armadas para evitar que amantes de bandidos transformem todo mundo em gay e para libertar o mundo da grande conspiração comunista e feminista que esconde de todos nós que a terra é plana injetando à força vacinas chinesas com chips da Microsoft bancadas pelo George Soros, entendeu? Vivem em bolhas e disputam entre si quem consegue chamar mais a atenção com alguma barbaridade (ver Redes Sociais).

Eleitor: sm. Sujeito que vota e que sabe ser tão importante para o futuro do país quanto uma gota de água na represa de Itaipu o é para iluminar São Paulo. Claro que junto de outros eleitores faz diferença, mas antes de se juntarem precisam resolver arestas como qual o tipo de pronome neutro usar. (ver otário).

Esquerdista: sf. Qualquer pessoa, animal, vegetal ou mineral que ouse dizer, insinuar, pensar ou achar que pensa que Bolsonaro pode, quem sabe, não ser um messias que nos salvará do pecado. Entre eles, brigam para saber quem está mais à esquerda.

Fake News: sf. O mesmo que mentira, mas dito em inglês para ficar chique e dar a quem a aponta um indevido ar de inteligência.

Honestidade: sf. Atributo de caráter que os candidatos sempre dizem ter. E que jamais reconhecem nos opositores. Passadas as eleições, vira uma questão de manter compromissos assumidos com os aliados (ver aliança).

Horário Eleitoral: sm. Programa humorístico obrigatoriamente veiculado nos rádios e TVs.

Ideologia: sf. Modo de pensar a convivência num mundo onde você é martelo ou prego. O martelo está à direita e o prego à esquerda.

Mídia: sf. Os grandes meios de comunicação do século passado, tipo TV aberta e jornal. O conteúdo se divide entre notícias, dramaturgia e bizarrices, também chamadas de programas de auditório. Nas eleições, o mais importante são os noticiários, que todo mundo diz que são ideológicos, interessados e dissimulados, mas recorre a eles para saber se o que o tiozão do zap mandou é ou não é fake News (ver fake News).

Otário: sm. Aquilo que quase todo mundo acha que você é. Às vezes, quase todo mundo tem razão (ver eleitor).

Polarização: sf. Jeito curioso de julgar pessoas e ideias segundo o qual só há dois modos de se pensar: os que concordam comigo e os que não concordam. Os que concordam são sempre inteligentes, honestos e sensatos. Já os que não concordam, deveriam sumir daqui (ver ideologia).

Redes Sociais: sf. Parte da internet onde as pessoas fingem que são felizes, inteligentes e ricas para serem admiradas por outras pessoas que fingem ser amigas. Lugar perfeito para candidatos que fingem ser interessantes caçar voto do eleitor que finge ser politizado.

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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política. 

Ilustração: Mihai Cauli 

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