Eduardo Paes lidera a única força política capaz de colocar um freio na desintegração social e política do Rio de Janeiro nas eleições de 2026.
– Começo com uma conclusão: ouvi e li inúmeras análises pessimistas, mas o quadro político nacional já foi pior para a esquerda do espectro político. Não significa que esteja bom, mas já foi pior.
– O pessimismo me parece desconsiderar a situação política antes da eleição, como se o Brasil fosse um papel em branco no sábado anterior à eleição e no domingo, do nada, quase 2 milhões de paulistanos escolhessem Pablo Marçal, entre outras aberrações extremistas País afora. Como sabemos, a coisa não foi assim. Então, comparativamente, de perspectivas para as eleições de 2026, o quadro é melhor. Nessas “pílulas”, contudo, analiso o Rio de Janeiro.
– No Estado do RJ, sim, aí a situação é de desintegração social e política que vem de décadas, começou lá atrás com a fusão entre Guanabara e Estado do Rio, a fusão que nunca se completou. Mas depois disso, muitos erros foram cometidos, em especial pela esquerda, que era majoritária no Estado.
– Claudio Castro é o ápice (até aqui) dessa desintegração: um governador que venceu a eleição em 2022, no primeiro turno, com 58% dos votos e que não manda em nada, foi colocado no poder pelos múltiplos grupos locais, “temáticos”, cada um com seus próprios interesses e agendas. Um títere.
– Podemos afirmar que o estado do Rio não é comandado por um grupo político, muito menos por um partido, mas por um ajuntamento de interesses desconexos e nada legítimos. Claudio Castro não pode encostar em nada, senão toma bronca e fica de castigo.
– Eduardo Paes lidera a única força política capaz de colocar um freio nisso nas eleições de 2026, mas não será fácil. A força dele na capital não se reproduz no interior. E são duas linguagens políticas distintas, da capital e do restante do Estado.
– A esquerda no Rio de Janeiro não é mais (faz algum tempo, aliás) um ator político relevante. Não teve votos aderindo ao Paes (PT, PDT, PSB e PC do B) e nem lançando candidatura, o PSOL. O PT tem apenas 3 prefeituras, ínfimo diante do domínio absoluto do conservadorismo.
– Por isso não entendi os sorrisos alegres de Benedita da Silva (PT), Jandira Feghalli (PC do B), Alessandro Molon (PSB) e Martha Rocha (PDT) ao lado de Eduardo Paes. Muito bom vencer a extrema direita, mas essa foi uma vitória do Eduardo Paes, solo, teve pouquíssima ajuda dos aliados de esquerda, salvo como margem de erro na pesquisa.
– Já o adversário do Paes na esquerda, o PSOL, por outro lado, também não disse a que veio. E o problema não foi apenas a pequena votação, a questão maior foi que ninguém notou a candidatura. Não polarizou com a extrema direita, nada fez em prol das agendas da esquerda… não disse a que veio, enfim.
– A candidatura tinha plena legitimidade, penso, mas se ela foi lançada porque alguém lá no PSOL realmente acreditava que poderia ter mais votos do que a extrema direita, no Rio de Janeiro, o que dizer… a esquerda já foi melhor de análise de conjuntura.
– A esquerda do Rio de Janeiro completou com absoluto êxito sua autodestruição, foram mais de 30 anos de incompetência, análises equivocadas, perdas de referências populares, distanciamento das demandas da periferia e elitização.
– O resultado é que nem mais atriz coadjuvante a esquerda é, só mera figurante para foto com político popular e gente boa do centro liberal, que quer se mostrar amplo e deseja, óbvio, o apoio de Lula nas eleições de 2026.
– Com a provável vitória de Rodrigo Neves no segundo turno, em Niterói, urge uma aliança deste com Eduardo Paes, em 2026. E que o Paes tenha a coragem de enfrentar esse desafio insano de disputar a eleição, vencer (não será fácil) e governar (mais difícil ainda) o Estado do Rio de Janeiro, o que significa, em primeiro lugar, decifrar o enigma da segurança pública, causa principal da desgraça de todo governante nas últimas décadas e, por outro lado, razão maior da ascensão da extrema direita no Estado e que se espraiou pelo Brasil, como um vírus que tudo contaminou.
– Algum político importante do passado teria dito que política é como nuvem, tudo poderia mudar de uma hora para outra, mas no Rio de Janeiro não tem sido assim, pelo contrário, vemos um contínuo domínio do conservadorismo, primeiro, e, depois, do extremismo. Uma caminhada constante e firme (como que inevitável) rumo à desintegração social, ao enfraquecimento do poder e do espaço públicos.
– O estado do Rio de Janeiro, hoje, como burocracia e poder efetivo, é mais ficção/fachada do que realidade. Vivemos dentro de um involuntário experimento quase anarcocapitalista.
– Nesse cenário, não vejo viabilidade numa candidatura de esquerda nas eleições. Não há viabilidade eleitoral e discursiva. A prioridade deve ser a reconstrução (ou construção) do espaço público, do Estado, mesmo que sob um viés que não seja de esquerda. Desde que haja um esforço para que seja democrático e minimamente republicano… está valendo.
– A esquerda, para ressuscitar, após as décadas perdidas pelos próprios erros, tem que, primeiro, reconhecer sua desconexão com a árida paisagem política carioca e fluminense, entender que é uma estrangeira sem vínculos com a imensa maioria da população, cidadãos que deixaram faz tempo de acreditar na política como “sonho”, “esperança”, “mudança” e outras palavras vazias de sentido no Rio de Janeiro do século XXI.
– O extremismo de direita, ao mesmo tempo, causou e se apossou politicamente dessa desilusão no Brasil todo, e em nenhum outro lugar é tão forte quanto no Rio de Janeiro.
– Pode mudar essa realidade até as eleições de 2026? Em tese, pode, mas o Rio de Janeiro tem sido de uma entediante (e trágica) previsibilidade, um fio contínuo que resultou em Claudio Castro, aquele que é sem ser, o vazio de poder, o corpo sem cabeça.
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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política.
Ilustração: Mihai Cauli
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