Um artigo precioso, um SOS para conservar a vida no planeta. Não é exatamente sobre o maior desastre climático no RS, mas explica por que eles tendem a acontecer mais e mais.

O IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) da ONU reúne alguns dos melhores especialistas do mundo na questão climática. Apesar de todos os alertas, a temperatura média do planeta está sofrendo aumento regular e persistente, principalmente pela concentração na atmosfera de gases de efeito estufa (GEE) que já está deteriorando a qualidade de vida na Terra. É obvio que um planeta de recursos finitos não pode pretender um desenvolvimento infinito.

Segundo projeções do IPCC, o patamar de concentração de gases de efeito estufa na atmosfera seria da ordem de 450 ppm (partes por milhão). Se não formos capazes de limitar o aquecimento a 1,5º C, é provável que as alterações climáticas se tornem a causa predominante da perda de biodiversidade nas próximas décadas. Para que se consiga limitar o aquecimento, inúmeras ações de peso deveriam ser implementadas com a maior brevidade pelos países emissores. Acontece que, desde o Protocolo de Quioto, em 1977, as ações mitigadoras e de controle ambiental têm sido insuficientes. Um verdadeiro gap de bom senso.

São cada vez mais frequentes as catástrofes ambientais: incêndios de grandes proporções, inundações cada vez mais intensas, desertificação, a aceleração do derretimento dos polos, das geleiras do Ártico, entre outras. Nossa reação mais comum é de resignação e de impotência em relação à caótica trajetória de destruição do planeta.

Alguns políticos e cientistas ainda se negam a acreditar no aquecimento global. Outros, apesar de não serem negacionistas, insistem no desenvolvimentismo desenfreado, atribuindo aos países desenvolvidos a responsabilidade pela situação, já que foram eles os causadores do aquecimento global.

Acumulam-se mais e mais evidências sobre a gravidade da situação climática. As geleiras do Ártico, dos Andes e do Himalaia estão derretendo em ritmo mais acelerado do que o previsto anteriormente. O Polo Norte poderá estar totalmente derretido em poucos anos e, com isso, deverá ocorrer a liberação de enormes quantidades de metano aprisionadas por milênios sob as camadas de gelo, o que causará um devastador aumento do efeito estufa já que o metano é 21 vezes mais agressivo que o CO2. A escassez de água no Himalaia poderá afetar 2 bilhões de pessoas na China, Índia e Paquistão, região de grande instabilidade. Já a perda da geleira dos Andes poderia prejudicar cerca de 80 milhões de pessoas.

Por outro lado, a elevação do nível de água dos mares, que afetará as populações das áreas costeiras, é causada tanto pelo derretimento dos polos como pelo aquecimento da água, que os expande volumetricamente. O aquecimento dos oceanos também poderá causar liberação do metano de seus bolsões sedimentares, o que teria impacto funesto na atmosfera e nos gases estufa, retroalimentando o aquecimento do planeta.

Mais preocupante ainda seria a diminuição da capacidade de absorção de carbono pelos oceanos como resultado de sua acidificação. Os oceanos respondem, anualmente, por quase a metade do CO2 que a natureza consegue absorver, seguido pelas florestas. A parte não absorvida, da ordem de 45%, vai se acumulando na atmosfera e aumentando o efeito estufa.

A composição da atmosfera terrestre vinha permanecendo equilibrada por mais de 20 milhões de anos. Contudo, nos últimos 100 anos, começamos a afetar o equilíbrio de calor entre a Terra e o Sol. Amostras de gelo obtidas de camadas profundas indicam que, há milhares de anos, o nível de dióxido de carbono na atmosfera era da ordem de 280 partes por milhão por volume. A partir dos anos 50, segundo observa Nate Lewis, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, essa relação aumentou, atingindo os níveis atuais da ordem 420 ppm. Alguns cientistas propõem fixar um nível máximo de 350 ppm, equivalentes a 745 bilhões de toneladas métricas de carbono.

Diversos relatórios, utilizando satélites, boias e modelos computadorizados do comportamento dos oceanos, concluíram que há mais energia sendo absorvida do Sol do que refletida de volta ao espaço, desequilibrando a troca de energia e aquecendo o globo terrestre.

Estamos lançando na atmosfera, anualmente, 36 bilhões de toneladas de CO2. Elas respondem por 60% do efeito estufa e provêm da queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo, gás natural, turfa), queimadas e desmatamentos. O planeta, com seus mecanismos de controle (plantas, solo, oceanos, sedimentos e rochas) não consegue absorver mais do que 55% dessas emissões; o remanescente fica na atmosfera por centenas de anos.

Além do CO2, também contribuem para o efeito estufa:

  • o gás metano (CH4), responsável por até 20% do efeito estufa, componente primário do gás natural e também produzido por bactérias no aparelho digestivo do gado, aterros sanitários, plantações de arroz inundadas, mineração e queima de biomassa.
  • o óxido nitroso – N2O, responsável por cerca de 6% do efeito estufa, e que é liberado por microrganismos no solo (por um processo denominado nitrificação, que libera igualmente nitrogênio – NO). A concentração deste gás teve um enorme aumento devido ao uso de fertilizantes químicos, à queima de biomassa, ao desmatamento e às emissões de combustíveis fósseis.
  • os clorofluorcarbonos (CFCs) – responsáveis por até 14% do efeito estufa, utilizados em geladeiras, aparelhos de ar condicionado, isolamento térmico e espumas, como propelentes de aerossóis, além de outros usos comerciais e industriais. Esses gases reagem com o ozônio na estratosfera, decompondo-o e reduzindo, assim, a camada de ozônio que protege a vida na Terra dos nocivos raios ultravioletas.
  • o ozônio (O3), responsável por 8% do aquecimento global, é um gás formado na baixa atmosfera, sob estímulo do sol, a partir de óxidos de nitrogênio (NOx) e hidrocarbonetos produzidos em usinas termoelétricas, pelos veículos, pelo uso de solventes e pelas queimadas.
  • o vapor d’água, presente na atmosfera, também absorve parte da radiação emanada pela Terra e é um dos maiores contribuintes para o aquecimento natural do Globo. Apesar de não ser ocasionado pelo Homem, é certo que, com mais calor, haverá mais evaporação d’água e, por conseguinte, um aumento de sua participação no aumento do efeito estufa.
  • outros gases também constam do Protocolo de Quioto como causadores de aumento no efeito estufa: hidrofluorocarbonos (HFCs), perfluorocarbonos (PFCs) e hexafluorsulfúrico (SF6).

Nos últimos 100 anos, a temperatura média do planeta aumentou em apenas 1 grau, o que já causou ciclones e enchentes devastadoras, secas impiedosas, agravando a desertificação, incêndios incontroláveis e o derretimento da calota gelada do Ártico que, segundo a Organização Meteorológica Mundial, poderá desaparecer nos meses de verão.

Diversos estudos indicam que, mantido o estado das coisas, a temperatura média da Terra subirá entre 2 e 4,5 graus até 2050. O bom senso aponta para a necessidade urgente de diminuição do bombeio na atmosfera de dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, externalidades negativas da atividade humana na Terra e que formam um cobertor em torno do planeta, impedindo que a radiação solar, refletida pela superfície em forma de calor, retorne ao espaço sideral. É o efeito estufa, responsável pelo aumento da temperatura global.

As acentuadas mudanças climáticas verificadas nos últimos tempos, o efeito estufa e o aquecimento global parecem não preocupar muito as autoridades políticas e econômicas mundiais. Continuam firmes e poderosos os lobbys das petroleiras, mineradoras, bancos, indústrias armamentista e automobilística, para citar somente alguns exemplos.

Os tão esperados investimentos socialmente responsáveis (SRI, na sigla em inglês), estancaram ao redor de 1% do total de fundos de investimento, o que é desprezível. A média mundial de consumo dos 7 bilhões de habitantes existentes na Terra é de 1,5 planeta. Ou seja, estamos consumindo 50% além da capacidade anual do planeta. Para evitar um colapso dos recursos naturais que são a nossa fonte de sobrevivência, precisamos avaliar e repensar nossos hábitos de consumo. Estamos aniquilando 50% dos recursos que pertenceriam às gerações futuras.

As sociedades mais desenvolvidas, e dentre elas, notadamente os EUA, primam pela economia do desperdício. Elas, definitivamente, não estão dispostas a abrir mão do estilo de vida já conquistado à custa de guerras imperialistas de conquista, concentração econômica, desenvolvimento tecnológico e industrial e padrões de consumo intensivos, com destruição acentuada do meio ambiente. E o modelo capitalista de financeirização contribui para o aumento da concentração mundial de renda. Basta constatar que as emissões de dióxido de carbono (CO2) de 77 milhões de pessoas (1% da população mais rica do mundo) representa 16% do total de emissões do planeta.

E, então, o que acontecerá com as nossas futuras gerações? Poderão elas continuar habitando o planeta? Serão elas forçadas a mudar drasticamente seu estilo de vida e de relação com a natureza, coisa que nossa geração de baby boomers não foi capaz de fazer?

Estudos psicológicos deixam patente que o ser humano só muda quando se defronta com algo drástico: perda de um ente querido, grandes catástrofes ou comoções, etc. Com a gradativa piora da qualidade de vida no planeta, é um absurdo ficarmos passivos, sem implementarmos, de imediato, algumas mudanças cruciais na maneira de nos relacionarmos com a mãe natureza. Contudo, observa-se uma grande esperança, e até mesmo uma “quase” certeza, de que a tecnologia trará as soluções. Será ela, realmente, a salvação? Ou estaremos simplesmente reconhecendo nossa incapacidade de enfrentar o problema e empurrando-o com a barriga?

Segundo John Sterman, do MIT Sloan School of Management, existe um grande bloqueio cognitivo e uma falha brutal no ser humano que impede até mesmo mentes brilhantes de entenderem e se conscientizarem do problema ambiental, mudando atitudes, e buscando soluções para mitigá-lo. Na maior parte das vezes, o que existe é uma postura evasiva e omissa.

No ritmo em que vamos, chegaremos em 2050 com um nível de CO2 na atmosfera por volta de 450 ppm, que equivale a 958 bilhões de toneladas métricas de carbono, bem além do limite máximo desejado, de 745 bilhões de toneladas métricas. Uma meta lógica, de simples manutenção de equilíbrio, seria a redução das emissões na mesma proporção do crescimento do PIB mundial. Pelo que se vê, isto mais parece uma miragem.

As universidades e os centros de pesquisa apontam para diversos projetos de vulto, dentre os quais os que buscam a redução dos raios solares que chegam à Terra, controlando, dessa forma, o efeito estufa. Algumas delas são bastante óbvias e já estão em curso:

  • Priorização da geração hidrelétrica com baixo impacto ambiental.
  • Energia nuclear em substituição à termoelétrica, cabendo às futuras gerações desenvolver tecnologia para se processar o lixo nuclear.
  • Desenvolvimento das tecnologias de geração de energia eólica, aproveitamento das marés, energia solar, biomassa, etc.

Os pesquisadores e cientistas estão trabalhando em projetos impactantes:

  • Sequestro do CO2 e seu armazenamento no subsolo – trata-se aqui de desenvolver tecnologia capaz de filtrar os gases, separar o CO2, comprimi-lo, armazená-lo em tanques e, finalmente, injetá-lo no subsolo.
  • Guarda sol gigante para refletir os raios solares de volta ao espaço sideral – trata-se de escudo espacial capaz de reduzir a incidência de raios solares sobre o Planeta, de 1 a 3%, o que também contribuiria para a produtividade agrícola e a redução do câncer de pele causado pelos raios UV.
  • Lançamento no espaço de trilhões de pequenos discos espelhados para reflexão dos raios solares.
  • Projetos de Resfriamento da Terra através do lançamento de enxofre na atmosfera e/ou pulverização de água salgada nas nuvens.
  • Fertilização do fictoplâncton (algas microscópicas) com ferro, aumentando a capacidade de absorção de CO2 pelos microrganismos.

Outras linhas de pesquisa estão voltadas para a sintetização das células, capazes de combater o CO2, os nano materiais tais como as estruturas metal-orgânicas (MOFs) que são cristais porosos que armazenam grandes quantidades de CO2, reaproveitamento de materiais de consumo e detritos, a automação, novos processos alimentares, dentre outros.

Com tudo isso, será que devemos apostar somente na tecnologia como saída para a mitigação do aquecimento global e inexorável destruição do planeta? Ou será que devemos, paralelamente a essa aposta, começar a tomar consciência da necessidade de mudança do nosso estilo de vida para uma forma mais equilibrada, domando a ganância e educando nossas futuras gerações para a aceitação do novo modelo econômico que será indispensável no futuro que se acerca?

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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política.

Ilustração: Mihai Cauli Revisão: Celia Bartone
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