A Câmara de Belo Horizonte acaba de rejeitar o PL 60/2025 que implantaria o sistema de tarifa zero no transporte coletivo. Foram 30 votos contrários e 10 a favor. Eram necessários 28 votos. O debate foi acirrado. Votaram favoravelmente à proposta os vereadores do PSOL, PT, PV e um do PSD. A proposta era viabilizar o transporte público urbano sem custos para os usuários. Haveria, basicamente, quatro fontes de receitas:
- i) subsídios do poder público a partir do Fundo Municipal de Melhoria da Qualidade e Subsídio ao Transporte Coletivo criado em 2019;
- ii) substituição do vale transporte pago pelas empresas por uma taxa mensal de R$ 168,82 por empregado a ser paga por empresas com mais de 10 empregados;
- iii) receita de publicidades em ônibus e terminais; e,
- iv) multas aplicadas às concessionárias por descumprimento contratual.
BH seria (ou um dia será?) a primeira capital a implantar o sistema de gratuidade nos ônibus municipais sem distinção de linhas, horários ou segmento social. Os subsídios estão crescendo vertiginosamente em toda parte. Em 2025, a Prefeitura de BH destinou R$ 744,7 milhões para o transporte urbano. Em 2024, o governo de MG havia destinado R$ 382 milhões para a aquisição de mais de 600 novos ônibus para o transporte da RM de BH. Em PE, o governo do estado deu um subsídio total de R$ 310 milhões em 2024 para o transporte coletivo do grande Recife. No mundo inteiro, o poder público banca o transporte coletivo. Na Região Metropolitana de Washington, os estados de Maryland, Virgínia e o Distrito de Colúmbia, além de alguns fundos federais, destinaram ao sistema um total de aproximadamente US$ 2,4 bilhões para o ano fiscal 2024.
Em resposta aos protestos de 2013, o Brasil já tem 136 cidades com ônibus de graça todos os dias. Uma população de 8,5 milhões de beneficiados. Em cidades como São Caetano-SP, houve uma redução do trânsito com a retirada das ruas de 1.500 carros por hora. Em Caucaia-CE, a frequência nos transportes públicos quadruplicou. Esses dados são consistentes com a expectativa de que a gratuidade melhore o trânsito com a redução dos carros nas ruas. Outra boa expectativa é de que a tarifa zero faça retornar aos ônibus a massa que hoje os trocou pelas motos. Sejam as próprias, sejam as dos mototáxis. A consequência tem sido uma tragédia urbana sem precedentes. Uma carnificina produzindo uma legião de mutilados e mortos. Como noticiou o Diário de Pernambuco no dia 3.10.25, 77% dos atendimentos do SAMU são causados por motos. Além dessas externalidades positivas na saúde e na mobilidade urbana, a tarifa zero também ajudará a diminuir a poluição das nossas cidades.
Por tudo isso, uma cidade como Recife e sua região metropolitana de 4 milhões de habitantes teriam muito a ganhar se ousassem promover uma mudança estrutural dessa monta em seu sistema de mobilidade. O transporte público está falido. As tarifas são altas para o baixo poder aquisitivo da população e as empresas estão operando com margens de lucro reduzidas ou deficitárias. Alguns empresários estão entregando as concessões. As linhas esvaziadas não atendem as necessidades da população que se mudou para as motos. O trânsito de Recife tornou-se um dos piores do Brasil. Não se vê qualquer iniciativa criativa para destravar um trânsito que bloqueia uma cidade inteira, com perdas na saúde e na produtividade bloqueada. Como os subsídios do estado transferidos ao Consórcio Metropolitano já são muito elevados, chegou a hora de experimentar mudar um sistema que fracassou em todos os sentidos.
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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política.
Ilustração: Mihai Cauli e Revisão: Celia Bartone
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