Várias pesquisas eleitorais saídas agora entre o final de junho e o começo de julho de 2021 (Datafolha, IPSOS, Ipec e outras) apresentam números da mesma ordem de grandeza para as eleições presidenciais do ano que vem. Entre os principais candidatos, o ex-presidente Lula apresenta números entre 40% e 50%, o atual presidente Bolsonaro começa a ficar com números abaixo de 25%, e um conjunto de vários candidatos, como os ex-ministros Moro, Ciro Gomes, Mandetta, o governador Dória, e empresários como João Amoedo e o apresentador Luciano Huck aparece com menos de 10%.

O primeiro ponto importante é que pesquisas eleitorais a essa altura do campeonato, mais de um ano antes das eleições e sem uma campanha eleitoral de fato nas ruas não mostram muito mais do que uma fotografia embaçada do que se pode esperar no ano que vem, quando se dão de fato as eleições. Em especial em um momento em que temas como Covid-19 e vacinas (e CPI do Coronavírus, e agora, das vacinas), renda para sobrevivência e emprego, inflação e preços de alimentos, combustíveis e energia, possibilidade de falta de água e luz, e impedimento do presidente no posto tomam muito mais a atenção das pessoas, que às vezes encontram dificuldades para conectar as suas preocupações do dia a dia com o processo eleitoral futuro, embora pareça meio óbvio.

O segundo ponto é que a lembrança das pessoas dos anos do governo Lula, em especial do final de seu mandato, parece bastante positiva, e isso se reflete nas pesquisas. Assim, o debate vai se afastando de acusações de corrupção e críticas ao processo jurídico que vitimou o ex-presidente, e se concentra nas boas lembranças, em especial dos anos finais de governo, e ainda mais fortemente na comparação da época de bonança de então com a lambança atual. Isso parece não apenas fortalecer o ex-presidente, como afundar o atual.

Um outro ponto aqui é que, afundado em denúncias de incompetência, corrupção e falta de capacidade política, o presidente Bolsonaro vai recuando politicamente para as cavernas de onde saiu. Sua base política é o fisiologismo onde, de fato, sempre sobreviveu e o radicalismo ideológico que dá base a seu discurso de extrema direita, e cada vez mais vai ficando aí confinado. Não é pouco (nem no Congresso, e nem nas ruas), mas confrontada a uma rejeição que já vai passando de 60%, vai colocando um limite evidente a uma possível reeleição.

Vale observar que o desenho das pesquisas aponta também para uma óbvia dificuldade em construir uma candidatura da chamada “direita” ou “centro-direita”, ou mesmo, como gostam de ser chamados, do “centro”. Além do baixo desempenho nas pesquisas, os números pesquisados para candidatos que tentam se mover com esse perfil mostram que eles disputam o mesmo voto (ou seja, se um crescer teoricamente o outro diminui), mas ao mesmo tempo existe forte disposição de eleitores de um desses candidatos não votarem no outro por diversos motivos, nem todos aparentemente muito coerentes. Falta em especial um “programa” capaz de unificar esses candidatos (por exemplo, o programa “desenvolvimentista” de Ciro não é capaz de aglutinar visões mais centradas em ajuste, como as de Amoedo, Dória, Moro e Mandetta, por exemplo, ou eventualmente do também governador Eduardo Leite). Quanto a Luciano Huck, nem se sabe objetivamente o que propõe, o que talvez seja sua força (ser só um espectro, uma imagem midiática).

Para além disso, o fato de que o atual presidente se mantém em outro patamar em relação a esses candidatos da centro-direita impede que se amplie a fatia a ser disputada por eles. Ou seja, mantido Bolsonaro na disputa, eles terão dificuldade para crescer e se apresentar como opção real. Por outro lado, o ex-presidente Lula cresce como “candidato de todos”, ou seja, amplia para o chamado “centro”, também colocando um limite óbvio ao crescimento da construção dessa alternativa “centrista”. Nesse movimento, Lula também acaba complicando a possibilidade de ter um programa mais transformador, mais à “esquerda”. Ou seja, a polarização atual impede igualmente que o chamado “centro” ganhe musculatura no processo e que uma opção de “esquerda”, mesmo que apenas programática (isto é, sem um candidato), se fortaleça.

Esta parece ser uma interpretação possível do “retrato” que as pesquisas nos mostram hoje. Muito embaçado, muito preliminar, mas algumas pistas estão lá.

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