Recentemente publicamos um artigo de Duilio Monroy “Bolívia: os desafios para o MAS 2.0”, no qual falou sobre os desafios da volta do Movimiento al Socialismo à presidência da Bolívia em um cenário bem diferente daquele em que Evo Morales governou, por 13 anos, até sofrer um golpe de Estado que não resistiu doze meses.

O vídeo que aqui exibimos é uma fala emblemática por ser o discurso oficial do indígena aymará David Choquehuanca, ao assumir como vice-presidente do Estado Plurinacional da Bolívia, na cerimônia que empossou Luis Arce como presidente, em 8 de novembro de 2020, perante a Asamblea Legislativa Plurinacional.

“Desde o ano 2006 – disse ele – começamos na Bolívia um duro trabalho para conectar nossas raízes individuais e coletivas para voltar a sermos nós mesmos, voltar ao nosso centro, ao taypi [a terra como centro de encontro, onde convivem as diferenças], à pacha [tempo e espaço], ao equilíbrio de onde emerge a sabedoria de uma das civilizações mais importantes de nosso planeta”.

O discurso é quase uma poesia. Tem 15 minutos e meio e cada segundo vale o tempo a ele dedicado, pois é a declaração da retomada não apenas do governo, mas também da base espiritual, do sentimento e da razão dos povos indígenas e originários que descendem dos incas e dos guaranis, que desde tempos imemoriais habitam a América do Sul e Central, em territórios divididos entre vários países pelo colonialismo espanhol e português.

Em certo momento de seu discurso Choquehuanca diz que “herdamos uma cultura milenar que compreende que tudo está inter-relacionado, que nada está dividido, que nada está fora. Por isso nos dizem que todos sigamos juntos, que ninguém fique para trás, que todos tenham tudo, que a ninguém lhe falte nada”. E logo, “a ayni, a minka, a tama, a tumpa, nossa colka [trabalho, cooperação, solidariedade, reciprocidade e formas de cooperação] e outros códigos da culturas milenares são a essência de nossa vida e nosso ayllu [grupo de famílias em uma comunidade]. Ayllu não é somente a organização de uma sociedade de seres humanos. Ayllu é um sistema de organização de vida de todos os seres, de tudo o que existe, de tudo o que flui em equilíbrio de nosso planeta, ou Mãe Terra [a Pachamama]”.

David Choquehuanca Céspedes tem 59 anos, nasceu e cresceu na comunidade de Huatajata, nas margens do lago Titicaca. É líder sindical, fundador e dirigente da Confederação Sindical Única de Camponeses da Bolívia e militante político de esquerda, fundador do Movimiento al Socialismo (MAS) junto com Evo Morales, de quem foi ministro das Relações Exteriores entre janeiro de 2006 e janeiro de 2017. Essa área, sob seu comando, foi marcada pelos esforços para integração latino-americana, em ações paralelas a seu colega brasileiro, o chanceler Celso Amorim.

Duilio Monroy afirma que David Choquehuanca é uma peça decisiva “para retomar o diálogo com setores da esquerda tradicional, de ambientalistas e outros que se afastaram do MAS”. Ele descreve Choquehuanca como “humilde e prudente” um “dos precursores das teorias do Buen Vivir, que propugnam a comunhão entre a produção, a harmonia e o respeito à natureza, a Pachamama”.

Ousamos garantir que depois de assistir o vídeo os leitores do Terapia Política sairão com a sensação de leveza do “Buen Vivir”: clique aqui.