Bolsonaro conversava e comia açaí na tigela com uma turma do núcleo duro do governo, quando o ajudante de ordens abriu a porta e avisou:

– Os russos estão chegando.

Entraram quatro russos, todos com cara de russo, jeito de russo e fardamento militar russo.

Um deles disse que era casado com uma argentina e que falava português. Foi o encarregado de dizer o que queriam.

– Nosotros querrremos ajuda militar.

Bolsonaro olhou para Augusto Heleno, que fez sinal de positivo com a cabeça, e disse:

– Temos um jipe, um soldado e um cabo.

O russo que fala portunhol olhou para os outros russos, que não diziam nada, e comentou:

– É preciso mucho más. Querrremos milicianos.

Bolsonaro vacilou para responder, e o russo voltou ao ataque:

– Querrremos seus garotos na linha de frente.

Carluxo era o único filho na sala. Olhou para o pai e para os ministros que permaneciam em silêncio e se encolheu no sofá.

– Querrremos aquele garoto do jipe, que disse que iria invadir o Supremo, e esse que esteve em Moscou. O do rachadinha não querrremos.

Bolsonaro reagiu:

– Meu filho foi a Moscou apenas para tirar foto ao meu lado.

– Mas é este que queremos e o mais o do jipe – insistiu o russo, apontando com o dedo na direção de Carluxo.

O clima ficou tenso no gabinete. Ciro Nogueira tentou socorrer os garotos.

– Eles não sabem nem dar tiro.

O russo que falava português olhou para os colegas russos e insistiu:

– Não importa. Não precisa dar tiro. É só aparecer em fotos com fuzis russos.

Bolsonaro achou estranho, arregalou os olhos, viu que os outros também estavam com os olhos arregalados e disse:

– Mando tanques, mas não mando meus filhos para a guerra.

O russo fez cara de brabo:

– Usted foi a Moscou dizer a Putin que estava com ele.

– Foi um blefe – disse Bolsonaro.

Os russos franziram o cenho e um deles ergueu a voz:

– davaige qvoz mem maqika pasmem.

O russo que falava português traduziu:

– Vamos pegar o rapaz.

O mesmo russo completou: Seus filhos são famosos em fotos segurando fuzis AK-47.

Bolsonaro disse que era apenas cena, que ele mesmo certa vez perdeu a arma num assalto.

Foi quando abriram a porta e Eduardo entrou no gabinete.

O russo gritou:

– É este que querrremos. O do jipe.

Eduardo deu meia volta e, quando estava tentando fugir, um dos russos, o mais ágil de todos, saltou nas pernas do garoto. Eduardo caiu sobre Ricardo Barros, que desabou sobre Onyx, que tropeçou na perna de um russo e caiu em cima de um vaso com orquídeas de plástico.

Quando Carluxo tentou fugir pela porta dos fundos, outro russo o perseguiu e o conteve com uma chave de braço russa. Os Bolsonaros estavam sob o controle de quatro russos, um deles mais parecido com um argentino do que com um russo.
Bolsonaro dizia que iria reclamar para a ONU, porque nenhum país pode obrigar o outro a brigar numa guerra, muito menos recrutando seus filhos.

O russo falante rebateu, apontando para Heleno:

– Aquele seu tio se meteu na guerra do Haiti.

Foi quando Queiroz entrou na sala com um AR-15 de cano curto, gritou ‘entreguem-se’, mas foi desarmado pelos russos. Queiroz caiu sobre a mesa e derramou a tigela de açaí de Bolsonaro no colo de Heleno, que comia mingau de maizena com bolacha Maria. (Artigo publicado no Grifo No. 21, abril de 2022. Clique aqui para ler essa edição completa.)

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Ilustração: Kleber
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