Estudiosos da história econômica se concentraram, em geral, nas abordagens que tratam a situação de auge no conjunto das atividades produtivas que consagra determinados períodos da trajetória brasileira de longo prazo. Em função disso, o agrarismo, por exemplo, teria registrado a expansão das economias açucareira (século 17), mineira (século 18) e cafeeira (século 19), enquanto a sociedade urbana teria percorrido o desenvolvimento industrial (século 20).

Autores fundamentais como Caio Prado Júnior e Celso Furtado também chamaram a atenção para um outro acontecimento não menos importante. Ou seja, o de que entre uma e outra situação de auge nas atividades econômicas teriam sido registradas as fases depressivas demarcadas pela regressão produtiva e expansão nas áreas de subsistência, especialmente durante a sociedade agrária.

A partir do ponto de vista histórico-econômico, podemos caracterizar o período iniciado em 1990, quando o Brasil ingressou na globalização, como o marco da desindustrialização nacional. Se combinado com os anos de 1980, denominada por década perdida, o país acumularia quatro décadas de estagnação na renda per capita nacional.

Lembramos que entre o esgotamento da economia mineira no século 18 e a ascensão da cafeeira no século 19, por exemplo, houve o intervalo de tempo caracterizado pela estagnação da renda per capita e o avanço da subsistência populacional. Não por acaso, conforme aponta o ditado popular: “em casa que falta pão, ninguém tem razão”, essa fase econômica depressiva foi acompanhada por intensa turbulência nacional, como a inconfidência mineira (1789) e a conjuração baiana (1798) no final do século 18, bem como as guerras da Independência e as várias revoltas provinciais até primeira metade do século 19.

Ainda mais grave do que a identificação da trajetória atual de estagnação da renda per capita no Brasil é o quadro depressivo do conjunto das atividades econômicas que vem se configurando desde a segunda metade da década passada. O principal elemento responsável por isso tem sido a queda profunda na produção industrial, que nos últimos oito anos acumulou uma regressão de quase 14%.

Para além do decrescimento econômico, sem paralelo no capitalismo brasileiro, é o processo do desinvestimento que acompanha a própria desarticulação do sistema produtivo nacional. Exemplo disso pode ser observado no setor automobilístico, outrora referência do protagonismo da sociedade industrial.

Entre 2016 e 2021, por exemplo, a capacidade instalada da produção automobilística no Brasil regrediu 9%, perdendo 26% do número de firmas fabricantes, 21,4% da quantidade das empresas de autopeças e de 6% do total dos estabelecimentos de concessionárias. No ano passado, a produção nacional de veículos automotivos foi de 2,12 milhões de unidades, o que equivaleu a apenas 42% do total da capacidade nacional de produção.

Atualmente, o Brasil, com a sexta maior frota de veículos do mundo, detém a idade média de 10,2 anos, correspondendo à mais velha frota de automóveis dos últimos 25 anos. Interessante recordar que no início dos anos 1990, o presidente Color de Mello comparava o carro produzido no Brasil à carroça.

O buraco sem fim no qual o Brasil atualmente se encontra não tem paralelo histórico. Com o decrescimento econômico já acumulado nos oito anos, percebe-se que em 2022 dificilmente a situação poderá ser revertida. O quadro econômico depressivo que resulta do estado prolongado e agravado da recessão também se expressa pela longevidade dos contidos patamares de produção e de investimento, falência de empresas, desemprego em massa e desânimo no consumo.

Esses efeitos da depressão econômica tendem a se refletir no futuro, caso não haja o rompimento estrutural com a fase atual de “histerese” que marca o Brasil. Isto é, a ausência prolongada de estímulos que possam alterar os principais motivos pelos quais prossegue o quadro atual da deformação da economia nacional.

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Ilustração: Mihai Cauli  e  Revisão: Celia Bartone 

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