Ezra Klein, colunista do New York Times e apresentador do programa The Ezra Klein Show apresentou um vídeo muito instrutivo sobre as estratégias de dominação política à disposição de Trump. A primeira que, segundo alguns especialistas, seria mais efetiva e perigosa, consistiria em governar de forma comedida, aumentando gradativamente seu poder e popularidade, conquistando legitimidade com a presença do Estado em lugares carentes de apoio, o que seria um golpe fatal na oposição e, muito provavelmente, o levaria à conquista de uma maioria avassaladora nas eleições de meio do mandato. A segunda, que foi a escolhida, segue à risca o roteiro de Steve Bannon que é a de atropelar a mídia e a sociedade com ordens executivas (decretos) nas mais diversas áreas, muitas das quais inconstitucionais, não dando tempo para a sociedade digeri-las. A população é informada através da mídia e ela não seria capaz de processar uma avalanche de novas medidas e atos administrativos inusitados. É o que Steve Bannon chama de “força muscular” (muzzle velocity), o que leva a uma acomodação da sociedade à nova forma de gestão, na forma de uma aceitação resignada. Isso porque, segundo Bannon, o partido de oposição é a mídia e esta é incompetente, preguiçosa e lenta, só conseguindo se concentrar em um assunto por vez. Trata-se, portanto, segundo ele, de inundar a política com um excesso de medidas, o que termina soterrando a mídia e a oposição. (Ver a entrevista de Steve Bannon)
Segundo Klein, a mensagem não é o conteúdo de cada ordem executiva que importa, mas sim, a sensação de que o país é do Trump e de que sua gestão é avassaladora. Até mesmo os decretos estapafúrdios entram nesse contexto, inclusive os passíveis de serem judicialmente rejeitados.
Klein comenta que o presidente Trump não pode se dar ao luxo de governar como um presidente legítimo, pois ele é um político fraco. De fato, segundo ele, Trump nunca quis ser presidente. O que ele sempre quis ser é um rei, lançando mão de suas qualidades marqueteiras, mesmo porque existem limitações de poder até mesmo para o presidente dos EUA. Primeiro, ser rei na TV. Se conseguir tal feito, o povo passa a acreditar que ele detém de fato todo o poder que ele supostamente encena ter. Mas, de fato, está longe de ter. Presidentes têm poderes limitados. Presidentes não podem reescrever a Constituição. Trata-se, portanto, de uma gestão caótica e imprevisível tanto do ponto de vista político como econômico. As diversas medidas passam a ser aceitas pelo povo como coisas normais, graças à estonteante irreversibilidade do poder do marketing e das redes sociais.
Segundo Klein, a única forma de combater essa estratégia de “força muscular”, de supostos fatos consumados, é não acreditar nas medidas, o que tira força das mesmas, sob pena delas se autoperpetuarem. A palavra de ordem é: Don’t believe him! Caso contrário, ele acabará convencendo a população que ele tem um poder imperial que de fato não tem. A estratégia é sobrecarregar a mídia, a oposição e a população com medidas estapafúrdias, populistas, de falso nacionalismo e de soberania espúria, criando fatos consumados que terminem não sendo mais questionados nem pelo povo, nem pela mídia, nem pela oposição, nem tampouco pela justiça.
Trump já assinou até agora mais de 50 ordens executivas desde que retornou à presidência em janeiro. O quadro ao final do artigo permite visualizar-se muitas delas, organizadas por área, assunto e uma breve descrição.
Diversos desses Decretos são inconstitucionais. Muitos terão problemas na Justiça. E, sendo assim, nesses casos, Trump facilmente recuará, alegando boicote, etc. Caso não aceite, enfrentará crise constitucional, opção que ele deverá evitar.
Sua aprovação em janeiro de 2025 já era bem baixa. E ele só conta com três cadeiras a mais na Câmara dos Deputados.
Um dos grandes problemas que deverá enfrentar é a degradação da saúde. Não se trata do Twiter (X) de Elon Musk que demitiu 80% dos funcionários. Se isso acontecer, será um escândalo.
Ao que tudo indica, a estratégia de Bannon aos poucos será enfraquecida e a oposição ganhará espaço. Não dá para inundar a mídia o tempo todo. A inundação também atingirá o governo Trump.
O perigo real é que Trump consiga convencer os americanos que ele tem um poder que, de fato, está longe de ter. Se ele continuar tentando sobrecarregar o povo americano, O lema é: Don´t believe him!
Clique aqui para ver algumas das mais de 50 ordens executivas assinadas por Donald Trump 2025.
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Ilustração: Mihai Cauli e Revisão: Celia Bartone
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